sábado, 3 de janeiro de 2009

Máscaras de si


As pessoas são surpreendentes e interessantíssimas. Máscaras, de fato, de si e para si mesmas. Daí os relacionamentos serem o que são: complicadíssimos, quando poderiam ser, simplesmente, complexos.
Não por acaso, o termo pessoa vem do latim persona, que na antiga Grécia designava a máscara que os atores usavam em cena. Não por acaso, adotamos uma máscara que todos confunde e, ingenuamente, somos, inclusive por nós mesmos, tomados por quem não somos.
Por isso, ninguém conhece ninguém, já que sequer nos conhecemos a nós próprios. Melhor dito, não nos reconhecemos no outro, embora nele projetemos todas as nossas mazelas.
Surpreendentes, sim, porque estamos sempre a nos surpreender com o outro e conosco mesmos. Nossa natureza é insondável, que me perdoem psicólogos e psicanalistas.
Interessantíssimas, se nos dermos ao mero trabalho de observar o entorno, com um pouco de fascínio no olhar. Porque é fascinante a nossa atuação no mundo, atores brilhantes que somos todos no imenso teatro da vida.
Personagens-tipo de uma fabulosa tragicomédia, rimos da desgraça que ajudamos a causar aos outros, choramos da desgraça que ajudamos a causar a nós mesmos.
Talvez, se espalhássemos espelhos refletores em lugares estratégicos do palco, pudéssemos ver o quão patética se torna nossa atuação, quando não respeitamos o tempo e a vez dos outros atores.
Após ter escrito este texto, caiu-me às mãos a poesia TABACARIA, de Fernando Pessoa, cuja estrofe XV transcrevo:


“Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi no espelho.
Já tinha envelhecido.
(...).” *



Publ. In “Revista do Ypiranga” nº 116, maio/jun/2002, pág.7.
* Fernando Pessoa – Seleção poética – Biblioteca Manancial em convênio com o Instituto Nacional do Livro – MEC – 1971.




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