sábado, 3 de janeiro de 2009

QUEBRA-CABEÇAS

Às vezes, em minhas reflexões, imagino a vida como um imenso quebra-cabeças que, por algum motivo incompreensível, resolvemos armar sem que sequer tenhamos um modelo.

Alguém, cujas intenções desconhecemos, nos teria remetido uma enorme caixa com os dizeres “Jogo da Vida”. Dentro, misturam-se inúmeras peças que identificamos como partes de um jogo de armar que imediatamente nos fascina pelo colorido, pelo prazer lúdico e, principalmente, pelo desafio que todo enigma proporciona.

Despejamos avidamente o material sobre um tablado, que servirá de pano de fundo para a nossa “construção” e nos deslumbramos com as sutis diferenças de tonalidade e formato que apresentam, com a incalculável quantidade de peças, com o tamanho de nossa própria curiosidade.

Excitados com a novidade, enchemos as mãos aleatoriamente e atiramos as peças para o alto, na esperança de que, ao caírem, a sorte nos ofereça alguma pista para o início da empreitada. Cedo, porém, nos damos conta de que só com uma boa dose de paciência, perseverança e bom senso, lograremos algum êxito.

Paulatinamente, nos dispomos a ir separando as peças que formarão a moldura do trabalho e ordenando-as ao redor do tablado, sobre o qual passamos a nos debruçar diariamente, embora nem sempre com a mesma disposição de espírito.

Vez por outra, questionamos o motivo de havermos nos lançado numa tarefa que nos parece inglória, sem sentido, inútil mesmo. Diante das dificuldades vacilamos, fraquejamos, pensamos em desistir.

Alguns, mais afoitos, chegam a destruir as partes já organizadas, por lhes faltar a visão do conjunto.A seguir, num momento de lucidez, lamentam o próprio descontrole...e recomeçam.

As primeiras recompensas da dedicação surgem no vislumbre de pequenos quadros, que vão surgindo aqui e ali, não obstante a existência de vazios entre eles – que alguns vêem como clarões e outros como buracos negros, dependendo da cor do tatame (pano de fundo) que utilizaram.

Com o tempo, embora cansados, às vezes exaustos, quase todos conseguimos levar a bom termo a tarefa que nos impusemos ou – e jamais saberemos – que nos foi sutilmente imposta pelo nosso enigmático doador.

Realizada a missão, alguns têm forças para erguer-se do tablado – em que pesem as dores nas juntas pelas desconfortáveis posturas assumidas – e conseguem admirar o conjunto de sua obra. São os privilegiados.

Outros, infelizmente, são excluídos do prazer final – como sempre o foram – e simplesmente adormecem no duro chão sobre o qual permaneceram ajoelhados durante tanto tempo, sem terem oportunidade de saber o que – se é que – construíram.

De qualquer maneira, todos acabam por dormir o sono dos justos.

Publ. in Revista do Ypiranga nº 122, jul/ago/2003

3 comentários:

Suzete Carvalho disse...

pronto mã tá arrumado t amo saudades

Anônimo disse...

Muito legal a crônica dona Suzete, parabéns. Gostei bastante.. Realmente a vida é um verdadeiro quebra-cabeça, nem todas as peças se encaixam.. Sempre haverá uma hora que elas irão se encaixar..

Suzete Carvalho disse...

Olá, Guilherme, que bom que você "gostou bastante".
Sobre o tema da crônica, me parece que a grande questão nesse quebra-cabeças é a gente não acabar "na horizontal", antes de acabar de montá-lo. Você diz que sempre haverá uma hora em que as peças irão se encaixar, mas a meu ver temos que estar muito atentos pra não deixar a hora passar...