quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Relação ambivalente

Travo com as palavras uma relação de intimidade ambivalente, quase...pecaminosa. Eu as provoco e elas me desafiam. Sirvo-as em bandeja de prata para que sejam devoradas por quem a elas tiverem acesso, elas me expõem em praça pública em toda nudez de meus pensamentos. Fustigo-as durante o dia para que cumpram sua missão, atormentam-me noite adentro para que cumpra a minha. Inverto-as e subverto-as e elas se recompõem à minha revelia. Quando creio estar no comando, percebo-me à sua mercê. Escondem-se quando mais delas necessito para reaparecerem, debochadas, em momentos inoportunos. Pretendem-se poderosas porque as realço em toda a força de seus significados. Pretendem-me frágil porque se acreditam a ultima ratio de minha sobrevivência mental.
Lineares, desconhecem as dimensões da Consciência. Não obstante, eu as venero, descendentes que são do próprio Verbo Divino.

6 comentários:

Eugênia Pickina disse...

Oi Suzete. Engraçado, mas li este seu texto e me identifiquei tanto!!! A mim parece que travo a mesma relação com as palavras... Talvez, tenha razão, elas, as palavras, descendam e ascendam do Verbo Divino... E por isso nos rendemos a elas. Obrigada pelo maravilhoso clarão! Bjs e abraços. Eugênia.

Suzete Carvalho disse...

Olá, Eugênia
Que bom que nos identificamos em nossos modos de ser e compreender.
Sua expressão "Engraçado, mas...", me remete a "en-graçar", envolver-se com a Graça. Alhures, ouvi uma frase interessante a respeito, que me parece apropriada: "A Graça existe, mas Ela não é de graça".
Talvez a ideia corresponda àquela noção de que, a todo trabalho (com as palavras, no caso),5 a 10% correspondem à Inspiração (Graça) e os restantes 90/95% devem ser fruto de nosso próprio esforço.
Fazer a nossa parte e agradecer, parece-me, é o que nos cabe.
Que a Graça Divina nos acompanhe a todos.
Beijos, Suzete

Anônimo disse...

belo texto , intenso !


diniz

Suzete Carvalho disse...

Obrigada, poeta.
Entrei no desmemórias e, uma vez mais, fiquei encantada (como sempre) com sua capacidade de sintetizar poeticamente as profundas metáforas que nos passam despercebidas no cotidiano.
Apareça sempre.
Abraços

Sanra Walquiria disse...

Como gostaria de ter essa verve. E olhe que leio muito, mas acho que isso é inato, minha poeta!

Suzete Carvalho disse...

Bem-vinda, Sandra Walquíria. Obrigada pelo comentário generoso. Bem-vinda sempre. Abração.