quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Nas tramas da rede

Termino o ano com uma sensação de lirismo, nostalgia, impotência contra as tramas do tempo ou, como diz Regina de Brito: Nas tramas da rede, expressão usada para intitular seu comovente Projeto Experimental do Curso de Jornalismo, publicado em 2000, mas que somente agora, por uma dessas “coincidências” (tramas da vida?), caiu-me às mãos.

Conheço Regina há anos, desses encontros festivos comuns nas famílias atuais, que se desdobram em várias, com alas que crescem paralelamente, mas sempre voltam a se re(unir), enriquecidas de rebentos e agregados. O que quero dizer é que somos... quase ‘parentes por afinidade’, digamos assim. Aniversários e Natais, abraços, comes e bebes, gentilezas recíprocas, ‘gracinhas’ das crianças, troca de presentes... e o tempo se faz curto para outras trocas, a dos sonhos mais profundos, ideais compartilhados (ou não).

O encontro real se dá num novo “acaso”, quando eu vasculhava a estante de livros de minha irmã - bicho de livro que sou - enquanto ela preparava seu indefectível café. – “Regina Brito não é a irmã do Guto?”, grito em direção à cozinha. – “É”. – “Então esse livro é de autoria dela?”. – “É uma monografia de fim de curso”. – “Posso levar? Devolvo assim que acabar de ler”. – “Claro!”.

Grata surpresa: a despretensiosa monografia é uma preciosidade, que resgata a saga dos caiçaras de São Sebastião ante a alienada devastação da Mata Atlântica, da fauna marinha costeira e das tradições centenárias de toda uma comunidade pesqueira, encalacrada pelo mais cruel dos predadores: o poder econômico.

Deslizando na fluidez e lirismo da narração, me apercebo, de repente, envolvida na reflexão de profundas questões político-sociológicas e ambientais, olhos ameaçando lavar meu rosto e minha alma, a memória a chorar minhas próprias perdas, as do bairro histórico onde sempre vivi, as deste país abençoado e desmemoriado e pelas perdas mais dramáticas porque envolvem toda a humanidade, as de Gaia - a dadivosa Mãe Natureza, destronada pela ganância e pela estupidez humana.

Obrigada Regina. Seu trabalho, deveria ser de leitura obrigatória às novas gerações.



quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Antevéspera

Antevéspera de Natal, espírito renovado por tantos votos de Paz e Amor, abro a home page da Uol para ficar a par das últimas notícias e meu coração se aperta de comoção ante o relato de um dos mais violentos, escabrosos, insanos crimes contra a humanidade, cometidos em apenas um dia (28/09/2009), na Guiné, antiga colônia francesa na costa oeste da África.

O relatório, recém encaminhado à ONU, descreve pormenorizadamente a barbárie perpetrada pela polícia local contra milhares de manifestantes reunidos em um estádio e que teria sido “orquestrada” pelo chefe de Estado para “intimidar a oposição”, fazendo o maior número possível de vítimas. Indefesas, mulheres e crianças foram submetidas a sevícias inimagináveis, enquanto os homens eram brutalmente assassinados sem qualquer possibilidade de fuga, pois uma unidade dos “boinas vermelhas” (a guarda presidencial), havia bloqueado previamente as saídas com arame farpado eletrificado.

Resta à ONU, criada após a 2ª Guerra Mundial exatamente para coibir holocaustos, levar os responsáveis a um Tribunal Internacional, que tentará “fazer justiça”. Resta aos líderes da Comunidade Internacional construir mecanismos de ação preventiva e Educação para a Paz, no sentido da erradicação de toda forma de tortura e terror da face da Terra. Resta à mídia cumprir sua missão maior de porta-voz da cidadania para tod@s, sem curvar-se a interesses plítico-econômicos.

Resta-nos, a nós, consumistas de plantão nestas Festas da Cristandade, fazer a nossa parte, denunciando, criticando, educando e alertando, a par de rogar à Misericórdia Divina que se compadeça da insensatez humana e não permita que, jamais, o medo, a alienação ou a indiferença tomem conta de nossas mentes e de nossos corações e nos calem diante das indignidades.

Por um Ano Novo mais digno para todos os homens, mulheres e crianças, de todas as cores e credos, de todas as raças, etnias e nacionalidades.



sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

NÓS PODEMOS

A expressão símbolo “We can” da campanha de Barak Obama para a Presidência da nação mais rica do planeta, parece realmente ter ou conferir poder. Não por acaso, tem sido adotada por algumas personalidades cujo trabalho, de alguma forma, está em evidência.

O uso de jargões célebres é uma tática bastante justificável, a meu ver, quando visa a qualificação da vida das pessoas em geral ou de grupos “ditos” minoritários – como idos@s, afrodescentes, servidor@s públic@s, etc. -, embora eu seja, em princípio, avessa a bordões e ditados populares que geralmente são eivados de preconceitos ou concepções retrógradas.

Assim é que, ontem, tive o prazer de ouvir o discurso de agradecimento pronunciado pela Dra. Thaís Helena Costa aos e às associadas que a reelegeram com expressiva votação, para compor o Conselho Deliberativo da Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (AFPESP) - a maior entidade de classe das Américas, com mais de 230.000 sóci@s -, de cuja Mesa Diretora ocupa atualmente o cargo de vice-presidente.

Seu tema de fundo foi, exatamente, a ideia do “nós podemos”, voltada à promoção da classe d@s servidor@s públic@s, no sentido de transcender (ainda mais) as usuais ofertas de lazer próprias das entidades associativas, oferecendo-lhes maior acesso à educação e cultura em geral e mais amplas possibilidades de qualificação profissional, a par da defesa de suas reivindicações funcionais.

Mais votada entre tod@s @s candidat@s ao cargo de conselheir@, o fato é que Dra. Thaís foi seguida de perto por várias outras mulheres lutadoras, em geral advogadas ou professoras, que merecem referência (e reverência) e que, para não alongar a crônica, citarei apenas pelos prenomes: Magaly, Regina, Vera Lúcia, Elza, Edna, Márcia e Ester.

Esperamos que seus esforços, somados aos das (proporcionalmente poucas ainda) demais mulheres que já integram o Conselho, por trazer maior equanimidade às decisões, revertam em benefício de tod@s. De parabéns o Conselho, a Associação e @s Servidor@s Públic@s do Estado.

Coerente com o título escolhido para a crônica, resta-me ainda deixar registrado também o fato prazeroso que vivenciei na véspera (dia 16), ao conhecer Dª Neuza, a vovó blogueira de 79 anos de idade, cujo mote é “se eu posso, outras pessoas também podem”. Sua disposição, conhecimentos e o trabalho que desenvolve em prol da cultura, nos fazem repensar nossa postura acomodada. Parabéns, Neuza, se você pode, nós podemos.




quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

A Aura Azul de Rudolf

Peço perdão aos leitores pelo intervalo prolongado. O cansaço e uma pequena cirurgia me tiraram (literalmente) do ar nos últimos tempos, mas volto revigorada para re-encetar nosso diálogo, esperando que a recíproca seja verdadeira.

Após uma rápida tentativa de descansar no Guarujá (vide postagens de 20 de novembro, intituladas “Consciência Negra” e Princesa da Orla II), voltei ao lar e me entreguei (antes da alta médica) ao “garimpo” de mais informações sobre os assuntos relacionados às minhas próximas co-participações em Coletâneas de Ensaios, uma sobre os 20 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente e outra sobre “Consumismo”.

Por “sorte”, um compromisso anteriormente assumido com amig@s, me levou a passar mais uns dias fora da cidade, agora na “deliciosa” Campos do Jordão, onde a riquíssima flora da Mantiqueira propiciou o relaxamento necessário à recuperação total de minha vista. Ao verde inebriante que recobre a montanha, acresça-se a profusão de hortênsias azul-violeta e folhas de araucária nas mais variadas tonalidades que dadivosamente se oferecem ao olhar, entre outras inefáveis belezas.

Não bastasse o esplendor da Natureza e a alegria do contato diuturno com pessoas queridas - Clara, Paulo, Dione, Valdir e João Baptista, meu "companheiro estelar" para usar a expressão de Eugênia Pickina que sempre enriquece o blog com seus comentários - tive mais uma grata surpresa: a visão da “aura” de Rudolf, um pré-adolescente dono de um par dos mais belos, profundos, compassivos e inteligentes olhos azuis que já conheci.

Sorridente, gentil e “antenado”, Rudolf – que poderia ser meu bisneto! - é daquelas crianças que têm o dom de nos devolver a confiança no futuro. Trocamos ideias e endereços (e.mail, orkut e blog – que ele também os tem) e nos comprometemos a manter contato. Vou desafiá-lo a postar um comentário nesta matéria, do alto de seus onze anos de idade. Aguardemos.

A propósito, aguardarei também que algum(a) leitor(a), apiedado dos compromissos literários que assumi, nos brinde com sua experiência, oferecendo “dicas” (sempre bem-vindas) e sugestões de leitura e de contato, especialmente sobre o trabalho infantil, seja doméstico ou rural e outras formas de exploração de crianças e adolescentes – esse o tema específico sobre o próximo Ensaio – para que possamos contribuir para que um dia o brilho dos olhos de Rudolf se reflita em incontáveis outros olhos infantis, sejam verdes, azuis, castanhos ou negros.