sábado, 18 de dezembro de 2010

RECONSTRUÇÃO

As festas de fim de ano se aproximam e lá vamos nós outra vez...prometendo a nós mesmos que no próximo ano tudo será diferente, sem nos darmos conta de que a vida não é um conto de fadas e, portanto, que não há fórmulas mágicas ou varinhas de condão que transformem automaticamente nossas vidas. Na euforia das comemorações, passamos ao largo da profunda metáfora contida nessas festividades: a oportunidade de renascer.

Assim, como diz minha conselheira Dª Nena, não basta sonhar, acreditar, prometer. Para renascer, há que pôr mãos à obra. Sair do conformismo, do medo das transformações e agir construtivamente, pois não nascemos prontos e acabados. Somos arquitetos de nós mesmos, seres livres para (re)construir a nós próprios e ao mundo do qual somos parte integrante, queiramos ou não.

Um mundo que precisa de nós tanto quanto precisamos dele para nossa própria sobrevivência. Uma liberdade que envolve sempre a liberdade do outro, seja ele quem for e que, Graças a Deus, impõe parâmetros a nosso egoísmo, pois é a livre existência do outro que nos permite encontrar um sentido para a aventura do existir. É no relacionamento com o divino, conosco mesmos e com a Natureza que construímos nossa própria humanidade.

Que as festas de fim de ano, desta vez, não se resumam a um consumismo repetitivamente alienado, mas que nos possam trazer maior conscientização sobre seu(s) verdadeiro(s) significados. Natal, como um renascimento da virtude da compaixão por nossos irmãos na Terra que, ao compartilhar dores e alegrias, mitiga aquelas, aumenta estas. Ano Novo, como uma possibilidade de recomeçar, de reconstruir relações e de ‘crescer junto’, tornando mais digna e mais feliz esta incrível experiência que é viver.

Publ. na “Coluna da Suzete”, do Jornal Gazeta do Ipiranga, ed. de 17/12/2010, pág. A-2.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Sonhos de Verão

Os meses de dezembro e janeiro representam para os brasileiros em geral, homens e mulheres de todas as idades, um tempo de alegria. Festas, capitaneadas por Papai Noel e férias escolares regadas por muita água, salgada ou doce - que a nós a Natureza concedeu como um privilégio – são os pontos altos do verão tropical, cujas estrelas são as crianças e os jovens.

A chegada de um novo ano, por seu lado, traz a possibilidade de um mergulho mais profundo, no qual resgatamos e trazemos à tona nossa capacidade de sonhar. Assim, a simbologia do renascimento, representada solenemente nas comemorações do Natal, apresenta-se em toda a sua grandiosidade: a possibilidade de recomeçar, que a todo ser humano é dada. Essa é a crença que nos fortalece e nos permite prosseguir a jornada.

Ano após ano, o ritual se repete. Sonhos frustrados renascem em toda sua potência, mas... vão se esvaindo paulatinamente, soterrados pela realidade, pela opressão do cotidiano. Como me disse há anos um amigo querido, o dramaturgo Luiz Carlos Cardoso: “Porque somos assim?”. O que não nos permite perpetuar esse estado de Graça em nossa vida e relacionamentos?

Consulto minha conselheira Dª Nena que, sempre disponível a uma boa reflexão, não se faz de rogada: “Sua preocupação é válida, filha, mas o assunto é muito complexo para ser debatido em uma simples crônica. Envolve aspectos desafiadores, como os condicionamentos culturais, o individualismo e a inversão de valores, o consumismo...” – “Pensei que você tivesse alguma resposta mais objetiva”, retruquei desconsolada.

Com um sorriso complacente, Dª Nena ponderou: “Não há como ser objetiva, em questões subjetivas. Talvez a graça, para a maioria das pessoas, esteja exatamente nisso: Aproveitar o verão para curtir as dádivas da Natureza e, porque não dizer, desfrutar os prazeres que sua situação econômica lhes oferece, sem se dar ao trabalho de grandes reflexões. Afinal, é tempo de férias e alegria, como você mesma disse”.

“Você tem razão”, respondo sem muita convicção, “mas, e quanto aos sonhos nunca postos em prática?”. – “Será que sonhos existem para ser postos em prática ou para manter nossa ilusão?” - “Ah, será que isso tem a ver com ideia hindu de Maya, a Grande Ilusão?”. – “Você não se emenda”, replica a sábia senhora, encerrando a conversa.

Então, para não perder a deixa - na verdade meu objetivo desde o início - , aproveito para apresentar a todas as pessoas que se dignarem a ler esta crônica, meus votos de sonhos alvissareiros e de que a alegria das Festas as acompanhe por todo o decorrer de 2011.

* Pub. in REVISTA DO YPIRANGA, ed. nº 153 – Nov/dez/2010 – pág. 13

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A Espada de Alexandre

Há meses não tenho oportunidade de postar artigos para a série Nó Górdio que fundei no blog, incentivada pelas “provocações” da jornalista Maristela Ajalla. Ontem, relendo trechos de O Livro de Ouro da Mitologia, de Thomas Bulfinck, deparei com o Mito de Midas, rei da Frigia e filho de Górdio, a quem se atribui um nó “a propósito do qual se dizia que, quem fosse capaz de desatá-lo, tornar-se-ia senhor de toda a Ásia”.

Como entender as origens das expressões que usamos, nos auxilia a entender as profundas metáforas tantas vezes nelas contidas, entendi por bem escrevinhar esta crônica reproduzindo a parte do mito que nos interessa, ou seja, no momento em que Górdio, um pobre camponês, chegou com a mulher e o filho numa carroça, à praça pública em que o povo estava exatamente deliberando sobre uma profecia do oráculo, segundo a qual o novo rei chegaria numa carroça.

Escolhido assim para governar a Frigia, Górdio teria dedicado a carroça à divindade do oráculo, atando-a com o famoso nó. Muitos teriam tentado desatá-lo em vão, até a chegada de Alexandre Magno que não se deu por vencido pelo insucesso de sua própria tentativa: impacientou-se, “arrancou da espada e cortou-o”. Com o tempo, Alexandre subjugou toda a Ásia, o que nos dá alento para tentar desfazer os nós górdios (ou os passos dados no passado e no presente, como diria Maristela) que nos atam, vez por outra, a situações aparentemente insolúveis.

E naqueles casos mais renitentes, em que quanto mais tentamos desamarrar, mais fortalecemos os nós, há, sim, que substituir o Jó que em nós subsiste e nos permitir uma dose de impaciência que nos leve a tomar de nossas espadas e cortá-los definitivamente. Só assim, talvez, conseguiremos “cumprir os termos do oráculo em sua verdadeira significação” subjugando nossos apegos.

Na primeira oportunidade, retornarei ao tema em artigo específico (Nó Górdio VI) e ficaria encantada se recebesse sugestões sobre questões que nos amarram inadvertidamente, para que pudéssemos unir nossos esforços para seu desate.

Namastê.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Ouviram do Ipiranga...

Procurando um mote para a crônica, resolvo dar uma perambulada pela vizinhança em companhia de Dª Nena, amiga e conselheira de sempre. Com a sabedoria de quem viveu as grandes transformações do século vinte, a sábia senhora me alerta a olhar o bairro com “olhos de ver” e não somente de criticar: - “Nossa tradição histórica é tão importante, que está representada no próprio Hino Nacional. Apesar de seus problemas, há também beleza e grandeza em tudo que nos cerca, portanto, não se atenha apenas às críticas”.

- “Por isso mesmo temos que ter vergonha na cara e procurar, no mínimo, mantê-lo limpo e à altura de suas tradições. Afinal, essa é uma das lições de cidadania que já devíamos ter incorporado”, retruquei. – “Está bem. Então vamos ao trabalho, mas seja mais flexível, observe as pessoas com compaixão, sinta os aromas, os sons....”.

A sirene de uma ambulância que passava em alta velocidade não me permitiu escutar o final da frase. Resolvi me fixar nos aromas, quando um ônibus que se aproximava reengatou a marcha, exalando um bocado de gás carbônico. “Há algo de podre no reino da Dinamarca”, pensei, sorrindo desanimada para mim mesma. Uma senhora que passava levantou meu astral ao retribuir simpática e alegremente o sorriso.

Reanimada, voltei meus olhos para uma bela árvore plantada nas proximidades. Sobre um pequeno canteiro que a rodeava, notei um pacote. Que conteria? Não precisei chegar muito perto...o odor revelou seu conteúdo. Alguém levara seu animal a passear e recolhera devidamente suas fezes em um saquinho, mas, que pena!, esquecera-se de fechá-lo e colocá-lo na lixeira. Apreendera a lição de cidadania pela metade. Com essa Dona Nena não contava. Nem eu.

Distraída, quase tropecei em uma mulher envolta em trapos, sentada no chão com a cabeça apoiada no muro de uma bela mansão tombada. Envergonhada pelo desequilíbrio social e, porque não dizer, pelos palavrões que me foram dirigidos, mal tive tempo de pensar na lição de Dª Nena sobre compaixão, pois logo à frente a potente campainha do palacete, tocada com insistência por um elegante senhor, atingiu meus tímpanos e meu cérebro.

Dª Nena me consolou: - “Irritou-se por que? Não era um mote que você queria? Pois já o tem...”.


*Publ.na "Coluna da Suzete" do Jornal Gazeta do Ipiranga, ed.de 12/11/2010, pág. C-4

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

De Novelas e Novelos

Tenho notado que algumas pessoas que se pretendem intelectualizadas e/ou politicamente corretas, insistem em afirmar, por si ou por suas famílias, uma pretensa aversão às novelas televisivas, tidas como causa de todas as mazelas que afligem a sociedade atual, assunto que a meu ver, merece algumas considerações mais aprofundadas por suas implicações sociológicas.

Toda novela contemporânea – em especial a brasileira, internacionalmente reconhecida não apenas pelo aprimoramento técnico, como especialmente pelo talento de nossos(as) artistas e a “inspiração engajada” de nossos(as) dramaturgos(as) – se caracteriza por ser uma narrativa que busca reunir em seu núcleo de personagens fictícios, importantes questões sociais que de alguma forma nos afetam a todos, ou seja, a novela televisiva, nada mais é que um reflexo da Novela Maior que é a própria vida em sociedade.

O fato é que, queiramos ou não, o substrato da novela é trazer à reflexão dos cidadãos e cidadãs as verdadeiras chagas subjacentes à convivência social, ressaltando os preconceitos arraigados em nossa cultura, o corporativismo dos grupos dominantes, o individualismo exacerbado que torna moucos aos clamores da Natureza e dos grupos populacionais mais vulneráveis, os ouvidos dos privilegiados.

A par de trazer à luz assuntos que relegamos ao esquecimento (como um “confortável” tabu), as questões sociais apresentadas pelas novelas, refletem a realidade dolorosa da convivência humana, constatadas nos chocantes fatos para os quais contribuímos, no mínimo, por omissão - das drogas à miséria, da violência doméstica à subversão de valores em todos os setores da sociedade – haja vista o enredo “abestado” da grande novela eleitoral - e que “assistimos” diariamente nos noticiários, como a um mero filme que nos emociona ou indigna momentaneamente.

Como lembra minha conselheira Dª Nena, em vez de projetarmos nos outros toda a responsabilidade pelo desequilíbrio social, precisamos repensar com autenticidade e ética nossa própria participação nesses complexos meandros, tecendo novamente os fios das necessárias relações de interdependência que nos unem, para que não se percam as novas gerações nesse frio labirinto, como os novelos habilmente desenrolados por pacientes tecelãs, que se transformam em aconchegantes mantas de inverno.

Enfim, é bom lembrar que para a maioria da população, a novela substitui o teatro e o cinema como a mais acessível forma de entretenimento e catarse.

• Publ.no Jornal Gazeta do Ipiranga em 15/10/2010, pág. A-4.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O trabalho juvenil como panaceia: uma desconstrução*

Considerações Introdutórias - Embora o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) esteja a comemorar duas décadas, suas disposições não foram suficientes sequer para contornar o escabroso problema da exploração da mão-de-obra infantil, agravada, exatamente nesse período, pelo aumento do contingente de crianças e adolescentes nas ruas, à mercê de indivíduos inescrupulosos (às vezes os próprios pais) que os forçam a oferecer quinquilharias e/ou drogas nos semáforos, quando não lhes impingem a mendicância.
O trabalho infantil no Brasil - A crise econômica do final do século XIX reforçou o antigo argumento do trabalho como panacéia para as questões sociais, oferecendo à sociedade brasileira mais uma “desculpa” para a exploração: a da preocupação com a delinquência infanto-juvenil. Deixava-se perpassar, àqueles a quem o trabalho infantil aproveitava (os detentores do poder econômico e político), a percepção de que a criança era uma mão-de-obra mais passível de ser intimidada e mais barata.
A chegada dos imigrantes para substituir os escravos, ao não acarretar também distinções entre adultos e crianças, igualmente incorporados ao contingente de mão-de-obra, contribuiu para a manutenção do statu quo ante, somente amenizado com a implementação de normas legais de âmbito nacional e internacional, já que a questão do trabalho infantil transcende fronteiras.
O rótulo “trabalho leve”, utilizado para designar qualquer trabalho desempenhado pelas “forças marginais” – crianças, mulheres e idosos – não significa um trabalho que exija pouco esforço ou não seja nocivo à saúde, mas sim aquele que é desvalorizado, considerado fácil, porque pode ser realizado por qualquer pessoa e, por esse motivo, “autoriza” uma baixa remuneração. Assim, essa conotação de “leveza” não é dada ao trabalho infantil (ou feminino) por suas próprias características, “mas pela posição que seus realizadores ocupam na hierarquia familiar”.
A partir da C.F./88, começaram a se organizar movimentos pleiteando uma legislação especial que tratasse crianças e adolescentes abandonados e/ou infratores como cidadãos, tendo sido editado, em julho/1990, o ECA, consagrando a doutrina da proteção integral. Decorridos 20 anos, verifica-se que essa “prioridade absoluta”, não foi objeto de conscientização social e se desvaneceu em meio a mazelas de toda ordem, que se refletem no afastamento do jovem das atividades escolares e no recrudescimento da miséria – consequentemente da ignorância e da violência –, a vitimizar principalmente nossa população infanto-juvenil.
A elevação da faixa etária para permissão do trabalho infantil não tem o condão de conferir cidadania à população infantil. Ao contrário, essa proteção fragmentada, pode ter e teve como corolário, a falta de um investimento maciço em políticas públicas educacionais, a par do aumento de menores abandonados e explorados como fonte de renda por “protetores” inautênticos, ilegítimos e/ou criminosos e a inserção dos jovens em novos e macabros “mercados de trabalho”: o das drogas e da prostituição infantil.
A partir de 15/12/98, foi elevada a idade mínima para ingresso no mercado de trabalho, passando a ser proibido qualquer trabalho a menor de 16 anos, a não ser na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. As demais vedações foram mantidas.
As concepções de criança/menor no Estado Novo (criança merece proteção e cuidado; menor merece repressão; criança é rica e tem que estudar, menor é pobre e tem que trabalhar; criança será o futuro do país, menor não terá futuro) ainda pairam sobre a cabeça de grande parte dos donos do poder político-econômico e/ou midiático.
Alegações de que o trabalho aprendiz é importante para a sociabilidade da criança, sua autoestima ou para prepará-la para a vida profissional futura carecem de fundamento, pois esse trabalho não raro a afasta da escola ou é a razão do seu desinteresse pelas atividades escolares, que são as únicas capazes de garantir-lhe qualificação futura para o mercado de trabalho.
A proteção ao trabalho infantil no Brasil de hoje - Apesar da legislação proibir, dados do I.B.G.E. indicavam em 2008 a existência de 4,5 milhões de trabalhadores entre 5 e 17 anos, sem falar no setor informal, em trabalhos sazonais e intermitentes e no âmbito doméstico, ou mesmo nas piores formas de trabalho infantil. Não obstante, em termos de garantir o acesso das crianças à escola, houve significativos avanços nessas quase duas décadas, os quais, entretanto, não afastam os persistentes problemas e desigualdades.
Costuma-se identificar a pobreza como o principal determinante do trabalho infantil, mas há outros aspectos, como a composição familiar (quando há vários irmãos, alguns costumam trabalhar para que outros estudem). ou nas famílias chefiadas por mulheres, o que certamente denuncia seu grau de vulnerabilidade. Também, quanto mais cedo os pais começaram a trabalhar, mais inclinados estarão em colocar seus filhos para trabalhar.
Enfim, apesar dos programas voltados a tirar as crianças brasileiras das ruas como PETI e o Bolsa Escola, é necessário que haja à disposição desses jovens uma escola pública de qualidade, que os mobilize e lhes ofereça uma formação capaz de lhes garantir uma ocupação futura digna, e que eles não se sintam “perdendo tempo” em uma escola precária e defasada, quando poderiam estar contribuindo para o sustento da família – e trabalhando para poder adquirir os bens de consumo veiculados pela mídia, em sua maior parte inacessíveis.
Questão a ser enfrentada pelas políticas públicas é a de que a escola profissionalizante é destinada aos jovens de camadas pobres, enquanto aos filhos das famílias abastadas é oferecida uma escola particular, moderna e atraente, garantidora de qualificação futura, o que alimenta a reprodução de uma estrutura social injusta, dificilmente superável. Deve-se levar também em conta, dentre outros aspectos, o fato de que o retardamento do ingresso no mercado de trabalho é um importante fator para o aumento de empregos para os adultos.
Conclusões - A crença indiscriminada no trabalho como valor dignificante em si mesmo, tem contribuído para perenizar a distinção social entre as classes privilegiadas – a quem cabe o trabalho intelectual – e as consideradas aptas somente para as atividades braçais, pelo simples fato de serem desfavorecidas economicamente. O trabalho infantil jamais será erradicado se não houver, a par de uma legislação e fiscalização realmente eficazes, uma conscientização social de que essa distinção também se exterioriza nas diferenças conceituais entre menor e criança, caracterizando uma discriminação a priori que se reflete, entre outras, nas “(...)propostas diferenciadas como a profissionalização e a repressão, para os primeiros, e os serviços essenciais como educação e saúde, para as crianças.”

* Síntese de artigo escrito por Patrícia T.M. Bertolin e Suzete Carvalho, in ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ESTUDOS EM COMEMORAÇÃO AOS 20 ANOS, org. Andréa B. Caraciola, Ana Cláudia P.T. Andreucci e Aline Silva Freitas, SP:LTr, pág. 264/277.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

MULHER E FILOSOFIA – Uma Visão Transdisciplinar

Introdução - A História e a Filosofia, substantivos femininos, são questões masculinas. Escritas por homens, para homens, a respeito de homens e de suas realizações, onde a mulher é vista como “fator secundário da sua espécie”, em um mundo androcentrado.
Gilles Deleuze afirma que “A história da filosofia deve não redizer o que disse um filósofo, mas dizer o que ele subentendia necessariamente, o que ele não disse e, no entanto, estava presente no que ele disse”. Qual o sentido de se “subentender necessariamente” proposições filosóficas que excluem ou tornam indigna a participação da mulher na história? Ora, se quando tratam das mulheres, os filósofos sempre mantiveram um monólogo, expresso ou não, deixando um legado de chauvinismo misógino, isto já não está entendido e subentendido?
O fato é que o ser humano é dicotomizado, o feminino sendo tratado como descartável (ao menos) da vida pública e intelectual, nada mais que uma condição imposta pelos deuses (e seus auto-intitulados representantes na Terra) à perpetuação da espécie, razão pela qual seu destino sempre esteve adstrito ao âmbito do privado, mas esse discurso não conseguiu apagar a presença de algumas heroínas que lograram deixar marcas de expressão como seres humanos pensantes, nos interstícios do silêncio que lhes foi patriarcalmente imposto.
Os tempos da Deusa -A história do ser humano como ser social não se resume aos registros escritos. Desde a pré-história, sua vocação gregária é inconteste e está documentada numa forma de comunicação simbólica, que poderia retratar a realidade isenta do dualismo forçado que se consubstancia em informações técnicas, porém, desvirtuadas pela linguagem excludente.
A filosofia nasceu entre os séculos VII e VIII a.C. como contra-ponto da razão às puras crenças mitológicas. Não obstante a sobreposição do saber epistêmico ao mítico, o arquétipo da deusa sobreviveu ao tempo, convivendo ainda durante séculos com o pensamento filosófico, até ser banido com a instauração definitiva do patriarcado.A argamassa social, sem o amálgama do feminino, desequilibrou os relacionamentos e degradou a participação da mulher na vida pública e intelectual. Aos filósofos coube a justificação da nova ordem, cujos pressupostos éticos foram consolidados com o triunfo do Cristianismo.
Se por um lado a imagem de Maria como a Virgem Santa traz alguns aspectos reverenciados na Deusa cultuada nas sociedades pré-históricas - generosidade, amor maternal, compaixão e paz –, por outro, dela se distancia por expressar uma visão de mundo hierarquizada, onde a mulher gera e o homem gere, sendo a submissão a característica feminina mais reforçada culturalmente.
Assim, a História e a própria Ciência acabam por distorcer evidências, como as “cenas de intimidade feminina” encontradas em escavações em Creta, interpretada como “tagarelice” feminina dos “escândalos da sociedade”. Somente com o avanço da arqueologia, os(as) estudiosos(as) passaram a reavaliar esses valiosos achados, atribuindo-lhes uma significação mais isenta dos preconceitos culturais que levaram a História a cometer erros crassos.
Não bastasse o legado tormentoso da Queda sobre a condição humana, o homem tomou a seu cargo o controle do Saber e a função de algoz de todas as “Evas Pecadoras”, impondo-lhes o recolhimento a um “papel feminino” pré-determinado, que tem como corolário a manutenção na ignorância. A clausura e o silêncio funcionaram como um castigo adicional.
O declínio da deusa - Dessacralizada a Deusa, o homem passa a ser o eixo em torno do qual orbitam astros desprovidos de luz própria: as mulheres. Ao princípio matrilinear da alteridade, sobrepõe-se o ensimesmamento patriarcal, que não aceita o diferente, o outro, principalmente quando esse outro é feminino. Mas “esta espécie ainda envergonhada” não se deixa abater e, deusa ou humana, vai deixando as marcas de sua passagem por esta Terra que é de todos. Assim, as qualidades femininas foram resguardadas no tempo, pois são imprescindíveis ao equilíbrio da humanidade.
Mulheres Filósofas – Na antiguidade, cabe lembrar inicialmente Hipácia “astrônoma, matemática, física, filósofa e historiadora, última diretora da Biblioteca de Alexandria, assassinada cruelmente pelos fanáticos do Patriarca Cirilo, pouco antes do incêndio que destruiu uma das maiores realizações da humanidade. Hipácia foi relegada ao esquecimento, seu nome banido dos registros, sua obra destruída. Cirilo foi canonizado”(Beto Hoisel).
Antes dela, raras foram as mulheres que se destacaram, portanto, não há como deixar de admirar a coragem de Safo de Lesbos, poetisa proclamada por Platão como “a décima musa”; de Aspásia, a cortesã nascida em 470 a.C, admirada por Sócrates por sua “rara sabedoria política” ou das mulheres que influenciaram Pitágoras, como a sacerdotisa Temistocléia e a filósofa Teano, a quem alguns atribuem ao menos parte de seus escritos e teoremas.
Ao acender (ou apagar) das luzes do Medievo, nova força patriarcal se (des)une ao cristianismo: O Islã. Filósofos como Avicena (980-1037) e Averrois (1126-1198), contribuíram para o desenvolvimento da filosofia tomista, solidificando a teologia cristã. Assim, se a Idade Média não foi um período de trevas, o foi com certeza para as mulheres, obscurecidas durante os séculos que se seguiram ao assassinato de Hipácia. Algumas, iluminadas, conseguiram distinguir-se por entre as trevas, principalmente quando conectadas ao misticismo cristão, entre elas a monja-filósofa Hilda de Whitby (614 a 680 d.C.); a mística alemã Hildegarda de Bingen (1098-1179), filósofa mística Beatrice de Nazareth (1200-1268) e Santa Gertrude (1256-1302), que brilharam por si e em si mesmas.
Nenhuma, porém, conseguiu, como Teresa de Jesus (1515-1582), canonizada em 1622, receber o título de Doutora da Igreja, provavelmente por haver fortalecido em seus escritos os dogmas do catolicismo, então ameaçado pela Reforma. Um último nome relevante (laico) a ser destacado já ao “apagar” da Idade Média é o da filósofa Cristina de Pisan, comparada por seus contemporâneos a Cícero e Catão, por sua eloquência e sabedoria.
A Idade moderna não é mais pródiga em revelar nomes femininos, exceção feita a duas pensadoras pré-feministas, Olympe de Gouges (1745/93), e Mary Wollstonecraft (1759/97).
Jornalista e dramaturga, democrata por convicção, Olympe se distinguiu por ser anti-escravagista e por sua luta pela igualdade de direitos, tendo contraposto à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, uma Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã (setembro de 1791) e escrito um (novo) Contrato Social propondo relações igualitárias entre os cônjuges. Sua decapitação pelo “Terror”, cabe como uma “luva metafórica”: a mulher, no androcentrismo, é corpo, não cabeça. Qual na celebrada democracia grega, dois milênios antes, os ideais que inspiraram a Revolução Francesa e a Declaração de Direitos do Homem, não se aplicavam aos excluídos de sempre (mulheres e escravos).
Mary Wollstonecraft entendia o feminismo como luta pelos direitos de toda a humanidade e não se deixou anular pela formação num lar sob a violência de um pai perturbado, transformando o sofrimento em alavanca para desenvolver as polêmicas “Reivindicações” que a levaram à cena dos debates políticos no contexto das primeiras Declarações de Direitos.
No século XIX, o surgimento de novas correntes filosófico-literárias, científicas e políticas, desfocou os interesses e a mulher, minoria solitária, se desdobrou. Ativistas em várias frentes, suas armas foram vestir-se de homens e usar pseudônimos masculinos, como George Sand e Flora Tristan. Filósofas, escritoras, abolicionistas, educadoras, sufragistas, socialistas militantes, não receberam o reconhecimento dispensado a seus pares, como aconteceu, entre outras, com a escritora Nísia Floresta (1810-1885), precursora do feminismo no Brasil.
A mulher na filosofia contemporânea - Na primeira metade do século XX várias mulheres conseguiram ser, pela primeira vez na História, respeitadas pelo mérito de seu próprio trabalho e ideias, independente do rumo que imprimiram a suas vidas privadas, como Margareth Mead (1901/78), Hannah Arendt (1906/75) Simone de Beauvoir (1908/86); Simone Weil (1909/43), Íris Murdoch (1919/99), Riane Eisler e Betty Williams, ganhadora do Nobel da Paz de 1976.
A antropóloga-cultural Margareth Mead não se limitou a teorizar, mas saiu a campo para estudar sociedades atuais cuja cultura é considerada “primitiva” e foi membro da “escola da cultura e personalidade” cujo expoente máximo foi Ruth Benedict (1887-1948). Hannah Arendt é outra demonstração do ecletismo feminino. Seus estudos sobre o totalitarismo revelam o perigo da condescendência como forma de banalização do mal, induzindo a uma ética de “não-violência vigilante e crítica”, a ser adotada por governantes e governados.
Já Simone Weil, asceta e mística, acreditava na meditação e na sabedoria dos ensinamentos contidos nos Livros Sagrados, como fonte de transcendência e, no jejum, como arma potente contra a injustiça. Iris Murdoch, também se insere no contexto filosófico do pós- guerra, ao unir seu misticismo à filosofia existencialista, tornando-se polêmica pela abordagem de temas sexuais.
Na última metade do século vinte, novas evidências científicas deslocaram o enfoque filosófico sobre a realidade bio-psico-física, social e cosmológica, ao abalar “verdades” milenarmente assentadas. É nesse hiato androcêntrico-filosófico, visto por alguns como a “morte da filosofia”, que a mulher se insere, conferindo-lhe novas perspectivas, na profusão de livros, teses e artigos de estudiosas(os) que passa a ser divulgada, numa reconquista feminina da liberdade de expressão. Infelizmente, este trabalho não permite um justo levantamento nominal.
Resta lembrar que a busca feminina por um mundo melhor, hoje transpõe inclusive barreiras religiosas dentro de seu próprio habitat, insurgindo-se contra orientações da Igreja, ao repensar o mundo atenta aos clamores ecológico-feministas e consequentemente social-filosóficos. Refiro-me à participação nos debates da monja e teóloga brasileira Ivone Gebara, cuja importante contribuição filosófica chega a incluir questões sobre a sexualidade, vista como uma questão política em sua surpreendente “teologia ecofeminista”.
Considerações Finais - A mulher já conseguiu atravessar o “umbral sagrado” que a separava do espaço a que sempre fez jus, mas não nos iludamos, o patriarcado, assim como a história ou a própria filosofia, como advogam vozes antifeministas, não acabou. A estrada é longa e pedregosa, em defesa do bom senso da humanidade.
Minha tese é a de que as mulheres não devem mais “redizer” o que disseram os filósofos a seu respeito, nem tentar mais subentendê-los, pois, ao fazê-lo, reforçam as considerações pejorativas que eles lhes dirigiram. Significa dizer que, aplicado o entendimento à Filosofia Feminista, sob o prisma da hermenêutica jurídica, a última ratio de uma solução justa à questão das mulheres é a própria realidade (a ultrajante condição feminina). Se a filosofia, como lembra Olgária Matos, sempre teve (ou deveria ter tido) a atribuição de consolar a alma sofredora, cabe-nos agora resgatar sua vocação curativa, fazendo cicatrizar as chagas decorrentes do esquecimento a que ela própria nos relegou, violentando nosso corpo e nossa alma.
Necessário se faz ressignificar eventos e redimensionar a História, enfrentando a fria razão patriarcal em suas bases lineares e utilizando todas as perspectivas que o saber humano nos oferece, sejam científicas, fenomenológicas, intuitivas, sincronísticas ou mitológicas. Acredito que a Filosofia precisa ser retomada e também redimensionada, reassumir sua vocação metafísica, num “repensar o pensamento” filosófico propondo novas respostas às indagações universais, fundada na relevância da experiência humana – feminina e masculina –, pois o feminismo já exorcizou a opressão.
Parece-me que, ao monopólio androcêntrico e à violência-simbólica de um dualismo ancorado no poder, disfarçado de saber filosófico, dever-se-ia contrapor agora uma filosofia inclusiva e eticamente fundada que, levando em consideração a experiência humana como um todo, poderia, quiçá, encontrar caminhos para enfrentar a mais profunda indagação da alma humana: Quem Sou Eu?.

(Resumo de Ensaio escrito por Suzete Carvalho, in Mulher, Sociedade e Direitos Humanos, org. Patrícia T.M.Bertolin e Ana Cláudia P.T. Andreucci, SP:Rideel, 2010, pág. 804/833)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

OUTUBRO

O mês de outubro é inspirador, pois desde sua primeira semana é rico em exemplos de trabalho e amor: dia primeiro é a data comemorativa da angelical Santa Terezinha do Menino Jesus; dia dois celebramos a data do nascimento de Gandhi, que coincide com o dia dedicado a todos os anjos; dia quatro é o dia dedicado a São Francisco de Assis e no dia oito reverenciamos Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil.
Meditar sobre o que representam, com seus legados de esperança para o futuro da humanidade, é uma forma de criar condições propícias ao aprimoramento das relações do ser humano consigo mesmo, com o outro e com o divino. A propósito, as mensagens e o exemplo de grandes homens e mulheres de todos as épocas, que marcaram a história da humanidade, são uma forma de re-encantamento do mundo, caminhos a serem seguidos especialmente em tempos de violência como o atual.
Para reverter o processo de violência e exclusão de que estamos saturados, temos que nos reconhecer como co-partícipes de um todo social e planetário que, se tem muitas fraquezas, tem na diversidade uma das demonstrações de sua grande riqueza e na união uma manifestação de sua força criadora, haja vista os movimentos sociais, com forte participação estudantil, que culminaram em outubro de 1988 com a promulgação da Constituição Cidadã, precursora de novos tempos de liberdade.
Mas, as comemorações de outubro não param por aí: dia doze celebramos o Dia da Criança, com seu papel preponderante no encantamento da vida; e dia quinze é dedicado aos professores, classe abnegada cuja vocação missionária é imprescindível ao desenvolvimento da criança, do jovem e conseqüentemente do país, como bem lembra Dona Nena, minha sábia conselheira.
Enfim, o dia vinte e oito é dedicado ao Servidor Público, em homenagem abrangente que compreende desde os chamados ‘barnabés’, que respondem pela maior parte dos serviços; o magistério e a magistratura sem cuja existência não haveria educação nem justiça; os policiais e militares de todas as categorias, sem os quais estaríamos à inteira mercê da violência; a classe médica – com sua missão curadora; passando por incontáveis outros trabalhadores até alcançar a classe Política, a quem cabe(ria) gerenciar esse universo.

Nas tramas do tempo

“Parece que foi ontem” é uma afirmação das mais constantes em nossas conversações. Aliás, é consenso geral que o tempo está passando cada vez mais rápido e muito se tem especulado a respeito do tema, seja sob um prisma filosófico-existencial (que o digam @s idos@s), seja sob as “antagônicas”(?) explicações místicas e científicas.

Á guisa de lembrete, acredito oportuno dizer que o uso mais ou menos frequente de aspas, interrogações e parêntesis quando escrevinho, nada mais é do que uma (forma de) provocação intencional a uma reflexão mais profunda, que lanço a mim mesma e, consequentemente, aos leitores e leitoras afeit@s ao pensar. Aliás, parece-me, é principalmente nessas insinuações “entrelinhas” ou subliminares – que se apresentam inclusive nas imagens, cores e situações vividas ou vislumbradas na arte -, que se nutrem nossas potencialidades criativas, numa “tradução/reconstrução cerebral” como diria o filósofo da complexidade Edgar Morin.

A propósito, aceitando o desafio que a divagação propôs e por ser um tema que me atormenta (ou deleita?) nas lucubrações filosóficas a que me entrego desde sempre, retorno à questão do tempo (embora não fosse esse o objetivo inicial desta postagem), apenas para lembrar ainda que a grande “sacada” sobre a verdadeira natureza do tempo cabe a Einstein, cujas pesquisas sobre a relatividade levaram à conclusão de que o tempo/espaço nada mais é do que uma dimensão que se deforma (encurva) ante a presença de corpos (massa) e/ou energia.

Neste momento em que me empolgo a divagar sobre um assunto sobre o qual minhas pesquisas são acanhadas e, portanto, quando corro o risco de me perder em minha “leiguice”, sou salva (como sempre) por minha conselheira Dª Nena: - “Afinal, sua proposta ao começar a “maltraçar” essas linhas, não era apenas pedir desculpas aos leitores e leitoras pela demora em voltar ao blog? Cai na real, mulher”.

De fato, minha única e humilde pretensão ao iniciar esta matéria era – e ainda é – informar aos(às) leitor@s que, apesar das várias interrupções temporais das postagens, o blog continua sendo a menina dos meus olhos e cada visita é recebida com o mais profundo respeito, haja vista que jamais deixei de responder aos comentários. Assim, os afastamentos eventuais (ou, se preferirem, a falta de periodicidade nas postagens) se deveram ao fato de que nos últimos meses os acontecimentos literalmente se (ou me) atropelaram, a ponto de fazer com que eu perdesse a noção do tempo.

Mais objetivamente: há nove meses, enquanto gestava co-participações em livros que recém vieram à luz, vi-me envolvida com inúmeros eventos culturais decorrentes de uma função que aceitei a pedido de amigos e à qual me atirei de corpo e alma (como aliás, é de minha índole, em tudo que faço). Eis senão quando, missão “mais alta se alevanta” e cuidados familiares e pessoais, necessários e urgentes, me forçaram a percorrer a dimensão do tempo por caminhos outros.

Mea culpa consignada, espero me redimir aos olhos d@s interlocutor@s e amig@s, oferecendo o melhor de mim nestes escritos e nos debates/palestras e Mostras cujos convites me acenam como corolário de um parto cultural feliz.

Namastê.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

De Poços e Fossas

Consternada com a luta pela sobrevivência - amplamente divulgada nos noticiários das últimas semanas -, de um grupo de trabalhadores soterrados pelo deslizamento de uma mina chilena de cobre e ouro, passei a filosofar sobre o comportamento humano em situações de estresse. Sempre atento, meu companheiro questionou: -“Acho que esse soterramento te deixou na fossa”. – “Não exatamente, mas fico pensando: eles no fundo do poço, tanta gente na fossa...”.

Como sempre acontece quando algo me preocupa, minha conselheira Dª Nena interferiu: - “Eis aí um bom tema de reflexão. Porque não escrevinha algo a respeito?”. Sugestão aceita, mãos à obra! Uma simples consulta ao dicionário, mostrou que entre “poço” e “fossa” há uma diferença essencial, embora ambos os termos se refiram a “buracos” mais ou menos profundos. Um poço sempre sugere a viabilidade de extração de algo valioso, como água, petróleo, etc., já, uma fossa pressupõe sempre o acúmulo de dejetos.

Embora ambos os casos tenham a ver com uma experiência de queda, cair não é decair. Caímos em algo, ou sobre algo, o que induz sempre a possibilidade de um retorno ao patamar inicial, seja por esforço pessoal, seja pela solidariedade humana. Decair é cair de algo a que nos havíamos alçado, daí a expressão “cair do galho”, tem a ver com depressão moral, uma angústia que inibe os esforços pessoais, requerendo, digamos assim, uma “faxina” com ajuda mais técnica.

Na verdade, a questão é muito complexa para ser dissecada numa mera crônica. O que me parece é que, no caso específico dos soterrados do Chile, estamos diante de uma situação-limite, a requerer fé, esforço próprio, união entre as vítimas, solidariedade externa e ajuda técnica, diversamente do que acontece quando dificuldades momentâneas nos levam a acreditar que estamos “no fundo do poço”.

Nestas, a dificuldade reside em nós próprios, em nossa incapacidade de fazer emergir nossas potencialidades - confiando na centelha divina com que todo ser humano é agraciado ao nascer -, de olhar nosso entorno com mais compreensão e perceber que estamos todos no mesmo barco (ou no mesmo poço), vale dizer, de que somos – queiramos ou não – necessariamente interdependentes.

Como alerta Dª Nena, se não nos unirmos e nos aceitarmos mutuamente, corremos o risco de transformar o poço em fossa.


* Publ. no Jornal "Gazeta do Ipiranga", ed.de 10/09/2009, pág. B-2.

sábado, 28 de agosto de 2010

DEVER DE GRATIDÃO III

Um dos privilégios que a vida me ofereceu, foi o de estar rodeada, seja nos momentos difíceis ou alegres, por pessoas maravilhosas, para com quem tenho um eterno dever de gratidão. Assim, tenho a honra e o prazer de agradecer de público a inestimável participação de amig@s e leitor@s no lançamento do livro objeto do Convite abaixo, seja comparecendo ao lançamento, seja ajudando na divulgação em sites, blogs, facebooks, twitters e orkut ou mesmo na mídia escrita (Revistas e Jornais).

Embora me seja impossível citá-l@s tod@s, já que fomos honrad@s com a presença de várias centenas de pessoas ao evento - entre autoridades, amigos, familiares, professores e alunos - acredito um dever de gratidão nomear ao menos algumas - cujo companheirismo e dedicação desinteressada foram decisivos para o sucesso do livro e do encontro - para representar a plêiade de homens e mulheres que nos prestigiaram.

Assim, ofereço um preito de gratidão às jornalistas Maristela Ajalla e Catarina de Moraes, pelo apoio incondicional durante as várias etapas do trabalho, culminando com a cobertura do evento; a Guilherme Giuntini que disponibilizou seu Twittando para a divulgação; a Gabriel Lyderis que se dispôs a multiplicar a divulgação nas várias redes sociais e a Laerte Toporcov que sempre tem um espaço reservado para divulgar nosso trabalho em sua conhecida Coluna na Gazeta do Ipiranga.

Devo prestar ainda toda reverência às incansáveis e competentes Dras. Patrícia Tuma Martins Bertolin e Ana Cláudia Pompeu Torezan Andreucci, organizadoras da obra, bem como à Editora Rideel, na pessoa de Ana Paula Alexandre, que, com certeza, endossarão meus agradecimentos. Que os Céus as iluminem para que possam prosseguir nesse caminho sem volta em prol da libertação da Mulher.

Particulamente,peço vênia para agradecer os incontáveis e.mails e telefonemas recebidos, bem como os belíssimos ramalhetes e vasos de flores acompanhados de mensagens generosas, como a do ilustre Presidente da Associação dos Servidores Públicos do Estado e sua esposa - Dr. Ribeiro Machado e dona Lúcia - e da gentil Coordenadora de Educação e Cultura daquela entidade, professora Magali Barros de Oliveira.

Por final, quero depositar essas demonstrações de amizade aos pés de meu marido João Baptista e minha filha Daniela, sem cujo apoio incondicional eu sequer teria conseguido realizar minhas pesquisas e escrevinhar aquilo que me vai no coração e na alma. Quanto aos eventuais frutos de meus esforços, ofereço-os a minhas netas Melissa, Amanda e a meu neto Rafael, paixões últimas de minha vida. À Providência Divina, ofereço minha alma, já que nossa vã linguagem não dispõe de palavras que possam expressar a profunda Gratidão por tantos privilégios.

Namastê.

domingo, 15 de agosto de 2010

Troços e Traças

Movidas pela euforia das comemorações – Dia das Mães, Dia dos Namorados, Copa do Mundo e férias – e também pela redução do IPI sobre automóveis, eletrodomésticos e móveis, muitas pessoas perderam o controle de seus gastos nos últimos meses, comprometendo o orçamento familiar e voltando a elevar os índices de inadimplência dos consumidores.
Essa constatação me fez lembrar um fato ocorrido há muitos anos, quando cursava o primeiro ano do Ginásio (que hoje corresponde à 5ª série do primeiro grau). Reclamando para meu pai que me sentia “jogada às traças”, pois as meninas eram obrigadas a ter lições de Economia Doméstica - enquanto os meninos podiam optar por aulas de seu interesse -, ouvi, surpresa: “Economia Doméstica é uma questão de família. Tem que haver o envolvimento de todos. Quanto às traças, só aparecem quando acumulamos troços”.
Hoje percebo que (já) àquele tempo, minha visão era mais sociológica, pois me preocupava o tratamento diferente dispensado às meninas e aos meninos, enquanto o enfoque de meu pai era mais voltado a outra questão prática: a da sobrevivência econômica das famílias de classe média, mesmo em uma época em que as pessoas não eram “abduzidas” pela mídia, com seus massacrantes apelos consumistas.
Percebo mais o quanto nossas preocupações de então se interconectam e fazem sentido ainda hoje em todos os aspectos da vida, porquanto é somente nas relações equilibradas entre as experiências do passado e do presente, entre masculino e feminino e entre receita e despesa, que as famílias e a sociedade como um todo conseguirão superar os desafios de um cotidiano cada vez mais complexo, em busca de um futuro melhor.
Embora as políticas públicas educacionais da atualidade estejam voltadas para os temas transversais, com a inclusão nos currículos escolares do primeiro e segundo grau, de matérias abrangentes do tema, como Economia Financeira e Ambiental, esses esforços de nada valerão se não forem levados à prática diária de todos os membros da família hábitos de reciclagem dos materiais não degradáveis e de consumo consciente de água, luz, gás, alimentação e vestuário e de toda energia não renovável.
Enfim, resta lembrar que a questão diz respeito não apenas ao orçamento familiar, como à preservação da Natureza e à própria sobrevivência humana, sem contar que há ainda muitos outros “troços” importantes a erradicar – como o preconceito, a miséria e a violência doméstica, entre outros – para que nossas crianças não fiquem jogadas às traças, vale dizer, à própria sorte.


Publ. no Jornal Gazeta do Ipiranga, em 13/08/2010, pág. B-2, "Coluna da Suzete".

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

AJUSTES

Tendo conseguido (assim espero) debelar uma inflamação dentária que me atormentou durante meses, minha amiga Cristina Domingos, odontologista competente e dedicada, tentou me tranquilizar enquanto procedia aos ajustes necessários a uma incrustação provisória: - “Só mais um pouco de paciência, Suzi, pois se as arestas não forem bem aparadas, podem causar sofrimentos desnecessários”.

Boca aberta (pela contingência) e, alerta a desafios intelectuais, intuí na frase uma potencialidade filosófica e, aproveitando o silêncio forçado, passei “filosofar com meus botões” a respeito da delicada questão dos “(des)ajustes”. Dª Nena, minha sábia conselheira, prevendo minhas infindáveis “viagens” especulativas, tenta definir o ponto primordial: - “Se pretende escrever algo a respeito, melhor centrar-se no objeto mais recorrente entre suas preocupações”.

Abro os olhos e deparo com o sorriso largo de Cristina: “Pronto, querida, acho que consegui aparar todas as rebarbas. Se nem isso der certo, talvez tenhamos que extrair essa raiz”. Ao chegar em casa, ligo o computador para anotar o “mote” para esta crônica. Ao abrir a caixa de correspondência, “dou de cara” com a mensagem postada em letras vermelhas, como que a me alertar a não esquecer do tema: “Relacionamentos precisam de ajustes”, que Cristina acabara de encaminhar.

Eureca! Esse é o cerne da questão. Relacionamentos precisam de ajustes delicados, pois se não forem aparadas as rebarbas sempre tão aguçadas dos egos que se interconectam, as sequelas do(s) desajuste(s) poderão tornar-se tão graves que a única solução será a extirpação de suas raízes, vale dizer, o afastamento definitivo entre os atores em desequilíbrio na grande tragicomédia que, tantas vezes, permeia a convivência em todos os âmbitos da vida social.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Mulher, Sociedade e Direitos Humanos

Preocupada com o fato de não ter tido oportunidade de atualizar o blog nas últimas semanas, devido a acontecimentos que fugiram ao meu controle, ontem fui deitar pensando que, talvez, uma forma de retomarmos nosso diálogo, seria convidar @s leitor@s para o lançamento de duas das Coletâneas das quais participei como co-autora no primeiro semestre.

Hoje, ao abrir minha correspondência logo pela manhã, “coincidentemente” deparei com um artigo na Coluna “opinião” do Jornal do Judiciário, editado pela FENAJUFE, a respeito da Violência contra a mulher. Logo na primeira frase, o Editor alerta: “Uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil”. Percebi nessa sincronicidade de preocupações, mais um motivo para convidar a tod@s para conhecer o trabalho de tant@s estudios@s da questão feminina, com vistas à evolução da mulher e, por conseguinte, da sociedade como um todo.

A primeira obra, intitulada MULHER, SOCIEDADE E DIREITOS HUMANOS, é um estudo crítico realizado por Mulheres da atualidade, tratando da condição feminina em todos os âmbitos da vida social, como família, história, cidadania, trabalho, educação, arquitetura, literatura, patriacado, direito, políticas públicas, filosofia, meio-ambiente, etc.
Trata-se de um verdadeiro Compêndio da Editora Rideel, com 833 páginas, contendo 33 Ensaios, a ser lançado no próximo dia 26, no Centro Histórico da Universidade Mackenzie (Edifício Ester de Figueiredo Ferraz, a quem o livro é dedicado).

A segunda, da Editora LTr e prefaciada por Gabriel Chalita, intitula-se “ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – Estudos em comemoração aos 20 anos” e é composta por 40 artigos, distribuídos em 496 páginas, escritos numa abordagem abrangente da tormentosa temática do universo infantojuvenil.

Ambas as Coletâneas terão pré-lançamento na Bienal do Livro que se realizará no Anhembi, de 12 a 24 do corrente mês, estando prevista a presença de grande parte d@s autor@s, em especial das Organizadoras Patrícia Tuma M.Bertolin e Ana Cláudia Pompeu T. Andreucci (livro sobre a Mulher) e Andréa Boari Caraciola e Aline da Silva Freitas (Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo que esta também contou com co-organização de Ana Cláudi Andreucci).

Meus agradecimentos a essas mulheres desbravadoras, que batalharam incansavelmente para a concretização dessas obras inovadoras, que, esperamos tod@s, possam contribuir para uma mudança de mentalidade, com vistas à construção de uma realidade “mais justa e equânime, mais igualitária, menos violenta e mais feliz”.

Namastê.

sábado, 17 de julho de 2010

JOGO DIVINO

A sociedade extremamente competitiva e consumista na qual estamos todos inseridos, devido a uma noção cultural que põe ênfase no “ter” e não no “ser”, faz com que determinemos nossos estados interiores pelas circunstâncias, sem que nos apercebamos que os “focos de perturbação” que não nos permitem ser felizes, estão dentro de nós.

Assim, empobrecemos cada vez mais nossas relações conosco mesmos e com os outros, acreditando (ou fingindo acreditar, para preservar nossa auto-imagem) que somos “os melhores” e que temos o direito de ganhar todas as competições e de consumir (no sentido de usar e abusar) tudo que é colocado à “nossa” disposição.

É essa educação egocêntrica que transmitimos a nossos filhos: – “Se perder, agrida”; “Se for agredido, revide”; e assim por diante. E esperamos realmente que eles sejam felizes! Mas como pode ser feliz quem transforma em adversários os companheiros deste incrível “jogo divino” que é a vida? Como pode ser respeitado quem não respeita o outro? Como pode alguém ser tão simplório a ponto de pensar que deve ganhar sempre?

Convenhamos: “não é por aí!”. Melhor parar com essa megalomania geradora de frustrações, com essa violência que só faz gerar mais violência, com essa falsa expectativa de que o mundo é do mais forte, mais rico, mais agressivo. Essa visão destrói o sentido comunitário, amplia os preconceitos, alimenta os focos de perturbação interna que todos sentimos em maior ou menor grau e que se revelam em forma de rancor, inveja, ciúme, medo e insegurança, entre tantas dores da alma.

Traduzir esses sentimentos é o primeiro passo para nos conhecermos interiormente e a melhor maneira de compreender as outras pessoas, independente de sua raça, cor, idade, sexo, crença ou profissão. Como alerta minha eterna conselheira Dona Nena – a quem já tive oportunidade de apresentar aos leitores da Gazeta -, respeitar o outro, seja ele ou ela quem for, e aqui se inserem os animais e a própria Natureza, é a única maneira de sermos respeitados.


Publ. no Jornal Gazeta do Ipiranga, edição de 16/07/2010, pág. C-10

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Remição

Re mi do

do si

do fa la do

sol do,

fa do

fa la do

sol, do

do re mi, do

fa sol la si.


* Possibilidades hermenêuticas (da literal à anagógica):

1 - do - Livre dos problemas que me atormentavam, volto a poetizar.
2 - re - Desbravando arquétipos (em busca do Self).
3 - mi - O carma e o dharma.
4 - fa - (De)grau da consciência (além do ego).
5 - sol - Reinações do Chacra Laríngeo
6 - la - Trono de Krishna/Olho de Shiva
7 - si - Transcendência (das trevas à Luz).

** Para Eugênia, Patrícia, Maristela, Cristina,Sílvia, Alzira e outras 'desbravadoras'.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Atendimento médico-hospitalar

Em depoimento postado em de 27 de abril de 2009 sob o título “Epopéia médico-hospitalar” – ao qual remeto os leitores interessados -, entendi oportuno deixar pública uma experiência vivida no Hospital de Cardiologia TotalCor, que à época julguei surpreendente, em função da sempre criticada questão da Saúde no Brasil.

Pois bem, há exatamente uma semana, me vi na contingência de estar novamente “hospedada” naquela Unidade, agora como acompanhante de meu companheiro, internado subitamente com um problema renal. Uso o verbo “hospedar” propositalmente, porquanto, de fato, o investimento no humano, sem qualquer descuido das providências técnicas necessárias à pronta recuperação dos pacientes, caracteriza o atendimento desse Hospital.

Acredito, feliz ou infelizmente, poder “falar de cátedra” sobre o assunto internação hospitalar, pois (como paciente ou acompanhante), nas últimas cinco décadas, inúmeras foram minhas “estadias forçadas” nos vários hospitais de São Paulo, seja em caráter particular ou conveniado e, a bem da verdade, devo dizer que, na maioria das vezes o atendimento recebido deixou muito a desejar no quesito humano.

Assim, acredito de justiça agradecer e elogiar o empenho de atendentes, enfermeiros e médicos do TotalCor, no sentido de oferecer um atendimento rápido, competente e respeitoso aos conveniados da Amil Saúde – Administradora do Hospital.

Durante a rápida internação, recebemos várias vezes no quarto a visita gentil do funcionário Cristiano Pita de Freitas, que se encarregou de tornar mais confortável e amena nossa permanência, inclusive disponibilizando Revistas e Jornais do dia (à nossa escolha). Deixo de elencar outros nomes, receando pecar por omissão, já que não menos atencioso foi o atendimento de praticamente todas as funcionárias.

Logo após a alta-médica, assinada pelo atencioso Dr. Antonio Luiz Monteiro Galas, - que nos entregou e explicou os resultados de todos os exames realizados -, o Sr. Cristiano que previamente nos havia informado que também teríamos direito a traslado gratuito, nos ofereceu uma refinada cesta de frutas e nos acompanhou até o carro confortável que nos levou de volta à nossa casa, onde, cinco dias após recebemos uma ligação do Hospital, indagando sobre o estado de saúde de meu marido.

Meus cumprimentos a toda a equipe do TotalCor, referência em atendimento médico-hospitalar.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Premência

Se a vida se impõe com violência
enfrentemo-la com veemência
para que perca a virulência
e não nos leve à demência
latência...da existência.

terça-feira, 29 de junho de 2010

FECHADO PARA BALANÇO

Antes do advento dos Shopping Centers e da Internet no Brasil, era comum nos depararmos com tabuletas afixadas nos estabelecimentos comerciais com a informação: “FECHADO PARA BALANÇO”. Meus pais e avós, comerciantes na região do Ipiranga desde os anos 30, costumavam pedir a colaboração dos mais jovens, nesse controle (manual) das perdas e ganhos, em especial após fases de movimento mais intenso.

Estante por estante, procedíamos a uma faxina generalizada e contávamos a mercadoria, separando e remarcando preços nas peças que se adaptavam à segunda importante etapa da vida comercial - a “Queima de Estoque” -, preparatória de uma nova etapa: o lançamento das novidades que compunham a “última moda”. Meu pai, um exemplo de desapego de bens materiais, praticamente “torrava” algumas mercadorias para torná-las accessíveis aos mais desfavorecidos, chegando ao limite de distribuir-lhes, gratuitamente, alimentação e medicamentos, levando-nos quase à falência.

Interrompendo essas lembranças, Dona Nena, conselheira sempre atenta às minhas elucubrações mentais, insinua: - “Percebe a metáfora?”. – “Sim, querida, percebo. Após uma fase prenhe de intenso movimento físico e emocional ‘fechei para balanço’ meu estabelecimento intelectual, tentando ‘faxinar as estantes do self’ e separando dores para uma ‘queima do estoque de sofrimento’, como preparação de uma nova etapa.”

Nesse controle (mental) de perdas e ganhos, analiso os porquês (das perdas) e descubro minha própria participação nas situações – talvez um certo despreparo para enfrentar as peças que a vida nos prega. Assim, conclui ser de bom alvitre pedir ‘concordata intelectual’ para poder continuar a trabalhar e saldar as dívidas contraídas com a cultura de Paz que abracei. Não cheguei à falência, porque sei que posso contar com o precioso apoio de credor@s (leia-se leitor@s), que acreditam na potencialidade curativa da imaginação.

Enfim, esse ‘blá-blá-blá’ filosófico foi a forma que encontrei de pedir desculpas pelo semi-abandono a que ficou (uma vez mais) relegado o blog, premida que estive por circunstâncias que (quase) fugiram a meu controle. Reabro, pois, meu “estabelecimento cultural”, embora ainda sob ‘regime falimentar’ oferecendo humildemente a tod@s meus parcos conhecimentos. Quiçá as (tormentosas) experiências que vivi recentemente possam de alguma forma nos ser úteis a tod@s. Envidarei esforços nesse sentido.

Namastê.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

NÓ GÓRDIO V

Em Nó Górdio IV, postado em 25 de agosto de 2009, abordei a questão da rotina como algo que embaraça nossos passos, condenando-nos à repetição e ao monólogo, embora nos aflore com uma enganadora sensação de segurança. Ao final, deixei como proposta de reflexão a seguinte pergunta: “Afinal, estamos condenados a nos repetir ad eternum ou a rotina (de pensamentos, palavras ações e meras atitudes semi-automáticas do cotididano) seria mais um nó górdio a ser desatado?”.

Ao reler, agora, os comentários à série de Artigos “Nó Górdio”, percebo que a jornalista Maristela Ajalla já havia proposto, em 27/05/2009, uma interessante “saída” para a ambiguidade da questão, ao lembrar que: "Se existem possibilidades de desenroscos dos passos do passado, só mesmo com novos enroscos nos passos do presente” (pois) “O enroscar é um ciclo... o coro das Moiras”.

O fato é que, acreditando poder nos desembaraçar da rotina estafante, muitas vezes somos colhidos nas tramas da imensa teia de relacionamentos que a todos envolve – já que o mundo nada mais é do que uma complexa rede de experiências, saberes e relações – e, inadvertidamente, acabamos aprisionados em algum novo “nó” caprichosamente apertado pelas artesãs do destino humano.

Melhor seria contentarmo-nos com as tediosas pequenas agruras do cotidiano rotineiro? Seria nosso desejo de transcendência uma afronta às determinações das deusas que, enfurecidas, criariam um sobre-acúmulo de nós górdios ao acionar a roda da Fortuna, de forma a emaranhar ainda mais os fios que traçam nossos destinos? Seríamos nós, afinal, meros joguetes em mãos de prepotentes demiurgos ou as mazelas em que nos envolvemos – seja na passividade da rotina, seja na tentativa de afrontar o destino – devem ser debitadas a nós própri@s, nossos pensamentos, palavras, ações e omissões?.

Desculpem-me @s leitor@s o afastamento involuntário das postagens neste blog – menina de meus olhos de tudo que escrevinho -, mas, como espero ter deixado claro, fui levada (durante os últimos tempos) de roldão por mares revoltos, nunca dantes navegados. Questões de toda ordem se apresentaram, impondo cuidados e afazeres, mas, perdoem-me as Senhoras do Destino, não me renderei enquanto as forças vitais não abandonarem meu corpo (mesmo que cansado e dolorido) e minh’alma prenhe ainda de inspiração.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Trabalho Voluntário

Toda ação humana requer algum tipo de esforço, de vontade, de construção. Seja físico, intelectual ou artístico, o fato é que o trabalho faz parte do cotidiano de, praticamente, todos os seres humanos, embora seja dito a bem da verdade, que algumas pessoas trabalham bem mais do que outras.

Construir uma vida, uma família, uma empresa, um clube, requer muita dedicação, num trabalho constante de amor e, nesse sentido, o Dia do Trabalho – em que pese a importância das reivindicações trabalhistas - poderia hoje também ser visto como uma espécie de celebração do próprio viver, uma homenagem aos homens e mulheres de todos os quadrantes, que anônima e heroicamente formaram a Cultura e a História humanas.

A luta pela sobrevivência que, de uma forma ou de outra, nos envolve a todos, não pode ser o único sentido da vida. Doar-se, num trabalho de amor desinteressado – a par do merecido descanso e lazer que todos merecemos –, visando melhor qualidade de vida para todas as pessoas, é doar a si próprio um novo sentido para o viver. Esse o porquê do Trabalho Voluntário.

Trabalho cansa, mas não estressa. O que estressa é nosso interior não trabalhado. É também, perceber a indiferença no olhar das pessoas, ante tantas causas de interesse comum – às vezes vitais, como a questão do meio-ambiente, que já nos afeta a olhos vistos. E não se diga que não temos tempo ou competência para fazer a nossa parte, pois cada um de nós é um universo de riquezas inexploradas. Por outro lado, é voz corrente que quando precisamos de ajuda, devemos pedir a quem é muito ocupado, pois o tempo nada mais é do que uma convenção (ou desculpa) encontrada pelos seres humanos para justificar sua trajetória na Terra.

Enfim, sejamos homens ou mulheres, jovens ou idosos, navegamos todos no mesmo barco a singrar esses mares revoltos dos relacionamentos, embora nem sempre nos apercebamos de que se houver um naufrágio ficaremos todos à deriva. Esse o caráter do trabalho voluntário: ajudar a equilibrar o barco – seja ele representado por uma comunidade específica ou por toda a humanidade.


Publ. in Revista do Cay nº 150, maio/junho - 2010, pág. 5.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

XEQUE-MATE

Como toda escritora que se preza, procuro manter olhos e ouvidos bem abertos (e, na medida do possível, a boca fechada – ainda que não me rodeiem mosquitos). Assim, eventualmente, sou brindada pela inspiração com alguns insights mais (do meu ponto de vista) ou menos (do ponto de vista d@s crític@s de plantão) interessantes.

Consideradas as palavras acima como mero preâmbulo, o que quero dizer é que a(o) observador(a) mais atento, toda reunião de pessoas com objetivos “pretensamente” comuns, seja em encontros de trabalho ou mesmo familiares, acaba se revelando como um microcosmo que reflete as mazelas – e as alegrias, porque não dizer - da sociedade como um todo.

Assim, por conta da fidelidade a compromissos sócio-familiares - e quem não os tem -, tenho participado necessariamente de discussões, debates ou diálogos (como eu preferiria poder chamar esses encontros sobre temas de “interesse comum”) que me permitem filosofar sobre nossos papéis nos diferentes contextos relacionais e as máscaras que utilizamos para desempenhá-los.

Peões e peoas despreparad@s que somos neste descomunal jogo de xadrez em que transformamos a vida, movemos nossos egos (ou por eles somos movid@s) em busca do xeque-mate – meta suprema de tod@ jogador@ -, medindo “forças” com o pretenso adversário, sem nos darmos conta de que @ outr@ é apenas um(a) parceir@ e de que o objetivo do jogo é o aprimoramento de nossas potencialidades.

Abrir caminho para a vitória “comendo” peças que possam tornar-se empecilhos, tocaiar @ inimig@, excluí-l@ sempre que possível, nos causam verdadeiro frenesi nessa ânsia desenfreada pela dominação. Humilhar o Rei – aquel@ em quem projetamos poderes imaginários -, subjugando-o e o fazendo dobrar-se ante tod@s é o supremo delírio a inflar nossos egos.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

BASTA UMA PALAVRA - II

BASTA UMA PALAVRA II


Madre Teresa de Calcutá, mundialmente conhecida por sua dedicação aos desvalidos da Índia, costumava dizer àquel@s que a visitavam em Calcutá, que qualquer pessoa estava capacitada a fazer caridade, eis que, muitas das vezes, basta apenas uma palavra. Ou um sorriso, poder-se-ia acrescentar.

O fato é que toda pessoa iluminada – e ela o foi, sem sombra de dúvida – consegue expressar profundos conceitos de sabedoria e amor utilizando um mínimo de palavras. É o caso do sábio conselho, pois, muitas vezes basta mesmo uma palavra para que renasçam esperanças ou para que a paz volte a encontrar guarida em corações amargurados.

Esmiuçada a expressão em todas as suas possibilidades conotativas, conseguimos detectar na frase simples, vista quase como simplória pelos donos da verdade, um alcance insuspeitado à primeira vista: Quantas vezes dizer apenas “te amo” ou “perdão” dissolveriam incertezas e ressentimentos.

Quantas vezes deixamos de dizer um simples “não”, um puro “basta”, um mero “adeus” que nos libertaria de tormentos, frustrações ou mesmo de um “distresse” – o estresse que se torna patológico. Temores reais ou imaginários, nos fazem adiar a decisão. Falta-nos coragem. Sim, coragem e decisão, estes os pressupostos da ação libertadora, tão simples e tão complexa: a palavra certa, na hora certa, para a pessoa certa.

Às vezes, verdade seja dita, faz-se necessária toda uma preparação psico-emocional ou mesmo concreta, como terminar um trabalho, fechar um ciclo. Mas, tomada a decisão, faz-se a grande descoberta: o próprio Cosmos passa a conspirar a nosso favor, as sincronicidades se apresentam como sussurros angelicais, o tempo voa nas asas de Kairós e, de repente, estamos frente a frente com nosso indefectível destino: a liberdade.

domingo, 11 de abril de 2010

Memória e Futuro

Hoje em dia, embora uma das palavras de ordem adotadas mundo afora seja “Preservação” - tanto do patrimônio histórico e cultural, quanto, muito especialmente, da Natureza -, nem sempre apreendemos bem a profundidade de seu significado e a importância de nossa participação cotidiana para sua defesa.

Preservar é salvaguardar tudo aquilo que está posto à nossa disposição, para que, a partir dessa realidade, possamos contribuir no sentido de qualificar cada vez mais a experiência humana no mundo, doando nossos esforços em prol de um futuro melhor.

Se não houvesse a memória, não haveria passado. Nem futuro. Um eterno presente, de repetições sem sentido. O ser humano não teria a oportunidade de aprender com seus próprios erros. Benditos erros - já que “errar é humano”, como diz o provérbio latino -, que nos permitem repensar e aprimorar a nossa postura diante da vida.

O fato é que Memória, História e Cultura são os elementos propulsores do desenvolvimento humano. Uma não existe sem a outra. Sem a memória, o ser humano, tal qual os animais, ainda estaria preso a seus instintos, inapelavelmente condenado a repetir-se. Não haveria História. Não por outro motivo, a Mitologia, com seus ensinamentos simbólicos, refere-se a Mnemosina, deusa da Memória, como mãe de Clio, a deusa da História.

A História e a Cultura são produtos das relações humanas, não se fazem apenas com grandes nomes, grandes eventos, grandes batalhas, mas com a experiência e o heroísmo anônimo e diuturno de cada um(a) de nós, que enfrentamos com garra os problemas do dia-a-dia, estudamos, trabalhamos e nos doamos às pequenas e grandes causas, lutando para que as novas gerações recebam fundamentos seguros sobre os quais construirão seu próprio futuro.

Publicada in Revista do Ypiranga, nº 149, jan/fev/2010, pág.5.

sábado, 3 de abril de 2010

Feliz Páscoa

Por uma dessas “coincidências significativas” a que estamos todos sujeitos, embora nem sempre a percebamos como tal, ontem ouvi uma conversa entre um jovem casal sobrecarregado com várias sacolas que deixavam entrever seu principal conteúdo: ovos de chocolate. O diálogo se deu mais ou menos como segue.

- “Só faço isso por eles”, disse a mulher, com certeza referindo-se às crianças que corriam logo à frente. “Na outra semana já é Dia das Mães e começa tudo de novo. Não vejo sentido nessas festas desgastantes, que dão tanto trabalho e acabam sempre em confusão”. – “Sem contar os gastos”, obtemperou seu parceiro em má hora, já que a jovem retrucou de imediato: -“A propósito, seu irmão é um pouco econômico demais para o meu gosto”.

O fato incontestável é que o Poder Econômico se assenhoreou das efemérides, de caráter leigo ou religioso, subvertendo significados e valores e redirecionando comemorações no sentido de seus próprios interesses, vale dizer, no incentivo de um consumismo desenfreado e vazio de sentido, induzindo a (des)encontros.

Com seu profundo significado de passagem, renovação, iniciação para um novo tempo, a Páscoa é (ou deveria ser) a celebração maior da cristandade, já que nos oferece a oportunidade de repensar e refazer comportamentos. Infelizmente, porém, as crianças – e, por que não dizer, os adultos - passam ao largo desse importante e ancestral simbolismo, “consumindo-se no consumir”, tão-só.

Nessa altura de minhas divagações, para não fugir à regra, minha conselheira Dª Nena oferece sua “sabedoria prática”, de forma um tanto contundente: - “O título não condiz com o conteúdo da crônica. É propaganda enganosa”. Pasma com a invasão terminológica na minha seara, retruco: -“Agora eu te peguei. Tem tudo a ver, sim, pois meus votos são de que @s leitor@s possam, nesta Páscoa, concretizar o verdadeiro simbolismo da passagem, dando início a um tempo de renovação, paz e amor”.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Princesa da Orla III

Minha/nossa linda Guarujá, aqui estou eu a seus pés uma vez mais e, como sempre, sua beleza me inspira, mesmo nos momentos em que, como agora, o sol está a brincar de esconde-esconde, por entre nuvens carrancudas. Nesse re-encanto inspirador da brincadeira cósmica, postei, já em 05/09/2009, o poema “Marcas Fugazes”, que, embora não o tenha revelado no tempo devido (mea culpa), foi escrito em tua homenagem.

O fato é que, nos últimos, digamos...55 anos(!) me permito voltar a brincar de poetiza de tempos em tempos e, agora, tenho a feliz oportunidade de participar do projeto “Duplo Olhar – Micropoemas em Macrofotografias”, em parceria com a fotógrafa e artista plástica Cristina Domingos, munícipe de Santos, cujo site pode ser acessado (como informei na postagem anterior) em link deste blog.

Alguns dos micropoemas foram criados especialmente para a Mostra que faremos em junho; outros foram extraídos de m/escritos poéticos ou em prosa, antigos ou mais recentes, como o poema acima citado, concebido em um passeio pelo calçadão de Pitangueiras numa tarde carregada de nuvens e nostalgia. As marcas fugazes deixadas na areia, à mercê do “des-com-passo” das ondas, entre outras tantas jóias metafóricas que a natureza nos oferece, são instrumentos sincronísticos que se oferecem para transporte da alma a paragens transcendentais.

Paragens habitadas por musas e por moiras, a traçar destinos, encontros e desencontros nos quais a arte emerge como força mediadora... E lá ia eu mergulhando nos mares mitológicos, quando sou trazida à realidade por uma voz arquetípica: meu alter (ou super?) ego – Dª Nena, minha super-conselheira: - “Você começou com uma ode ao sol das três horas da tarde e vai encerrar sob a luz do luar da meia-noite. Isso é o que acontece com quem quer fazer tudo ao mesmo tempo”.

Tento brincar, já que o lúdico é o mote da postagem: - “É que eu sou polivalente”. – “Nem tanto, pois você veio ao Guarujá exatamente pra fugir do estresse. Porque não dá um tempo a si própria? Trate de ir dormir, pra amanhã cedo poder aproveitar a beleza da praia, pés na areia e...” – “Era exatamente sobre isso que eu estava escrevendo. Imagine que...” – “É isso, seu problema é excesso de imaginação. Boa noite”.

Boa noite, Dª Nena; boa noite minha/nossa linda Guarujá, que agora vou me entregar aos braços de Morfeu, o deus m i t o l ó g i c o do............zzzzzzzzzzzzzzzzzzzz.

terça-feira, 16 de março de 2010

Cromoterapia I*

Flora natural

A colorir e curar

As chagas do mundo.

Cromoterapia divina.

* Micropoema que comporá uma das telas do trabalho que a artista plástica Cristina Domingos está preparando para nossa Exposição DUPLO OLHAR - MICROPOEMAS EM MACROFOTOGRAFIAS.

Os poemas que compus para essa série estão sendo inseridos artisticamente em macrofotografias selecionadas para a Mostra.

O site de Cristina Domingos está linkado no blog.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Dia da Mulher

Ano passado, nesta data, postei uma mensagem intitulada “Dia Internacional de Quem?. Hoje, tendo acabado de entregar o ensaio “Consumismo – Uma questão de Poder” às organizadoras da Coletânea sobre os “20 anos do Código do Consumidor”, a ser lançada em junho, me ocorre perguntar: A quem aproveitam comemorações como o Dia da Mulher, do Idoso, da Criança, etc.?

Antes de mais nada, por questão de justiça, amor e amizade, devo declarar que nos últimos meses tive a honra e o prazer de escrever esse e outros dois trabalhos (“O trabalho Juvenil como panacéia – Uma desconstrução” e “Segregação Ocupacional da Mulher”) em co-participação com a jurista Patrícia Tuma M. Bertolin, a quem já tive oportunidade de citar no blog
[1] .

Faço o registro como uma homenagem a todas as mulheres, esposas/mães profissionais ou “meras” donas de casa (quando as possuem), que se desdobram em todos os quadrantes da Terra para atender aos homens, a quem nunca foi dedicado um “Dia”, quiçá porque todos os dias/minutos/horas ainda, de certa forma, lhes pertençam.

Mas, honra seja feita também aos homens cuja supremacia tem sido posta à prova nestes novos tempos em que a mulher foi à luta para (re)conquistar o lugar do qual foi desalojada desde os tempos da Deusa-Mãe, com o (des)assentamento androcrático; aos homens de boa vontade que, superando seus próprios preconceitos, se fazem parceiros de todas as horas – não apenas na alegria e na dor – mas, principalmente no trabalho cotidiano do lar, antes reduto (e ônus) exclusivo das mulheres.

Possamos nós, heróis e heroínas anônim@s de todas as idades, raças e credos, encontrar um caminho de equilíbrio de nossas potencialidades para que todos os dias sejam dignos do ser humano, sem que nos precisemos dobrar a injunções dos que se acreditam donos do poder, seja econômico, androcrático ou divino.



[1] Vide “De Rios e agradecimentos”, postado em 13/09/2009

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Harmonia

O ribeirão, num crescendo,

chega ao mar,

se arremessa em choque, e...

Ironia!

O turbilhão anuncia e

faz gerar

a harmonia.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Ainda às voltas com o Tempo

Ainda às voltas com a questão do tempo, deparo com os instigantes comentários de três mulheres especiais: Camila, Eugênia e Maristela, postados na matéria escrita no último dia 8, que intitulei Tempo de Kairós.

Camila, que infelizmente não tenho o prazer de conhecer pessoalmente, mas por quem já nutro admiração, me alerta sobre as “cobranças por toda parte” que inadvertidamente revelo ao me desculpar por não poder imprimir ao blog a dinâmica que lhe é (ou deveria ser) própria. Em poucas palavras, faz uma análise muito apropriada de meu post – apesar de, humildemente, declarar que espera conseguir “interpretar de forma correta”. De fato, a nova, que já se faz querida, leitora, detecta um paradoxo essencial: se, por um lado, há “vontade de fazer tudo”, por outro, há o reconhecimento de que “tudo tem seu tempo”. Encontrar esse equilíbrio é exatamente a proposta.

Eugênia, cujas observações sempre acrescentam sabedoria ao que escrevo, fala em esperança num “tempo que se faz redondo” e, em sua generosidade nata, me incentiva sempre a continuar. Com a competência despretensiosa que caracteriza seus escritos - blogueira, advogada e palestrante que é -, toca numa questão transcendental: o tempo, que acreditamos sequencial, visto como um círculo a fechar-se em si mesmo. Espiritualizada, entrevê Orobolos, a “cobra que se devora a si mesma” e, com simplicidade, nos remete aos mais profundos ensinamentos esotéricos. Alquimia Pura.

Maristela, que carinhosamente apelidei de “jornalista milagreira”, acrescenta importante reflexão: a de que nossos escritos possam existir num outro plano e, portanto, “vencem o tempo” que, aliàs, de acordo grandes estudiosos da Física e da Química – ela cita o prêmio Nobel Ilia Pregogine -, talvez sequer exista. Enfim, seja apenas uma convenção imaginada pelos seres humanos para agregar sentido às suas concepções de vida ou mera dimensão que ora atravessamos, seja um deus ou um demônio, seja eterno, passageiro ou infinito, o fato é que não podemos permitir que o Tempo nos devore (como Chronos).

Neste exato momento (do tempo?) em que minha imaginação está prestes a viajar nas asas de Kairós, minha sábia conselheira Dona Nena intervém: “Filha, já ‘viajou' o suficiente por hoje. Agora ponha os pés na Terra e dê um tempo ao tempo e a seus(as) leitor@s, antes que lhes esgote o tempo e a paciência”. Obedeço.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

2010 - Tempo de Kairós

Hoje, sou alertada por minha conselheira Dª Nena, logo ao acordar: - “Vamos nos organizar? Acho que está havendo um ruído de comunicação. Não somos eu e o blog a precisar de férias, é você. Como incentivar o diálogo, mola mestra d@s blogueir@s, se não consegue fazer a sua parte? E digo mais, não se assoberbe, para que não se “abafe” a inspiração. Delegue funções, divida preocupações. Aprenda a dizer não, inclusive a você mesma”.

Envergonhada, percebo que estou entrando no “jogo do tempo” e, como sempre fazemos quando apanhad@s em flagrante, tento me defender: - “É o tempo que está acelerado e eu tenho que correr atrás, para dar conta do recado.” - “Você se esquece”, responde calmamente a sábia senhora, “que o tempo é apenas uma dimensão pela qual estamos passando? De que adianta correr atrás de algo que se desfaz em si mesmo?”.

Tento desarquivar da memória ensinamentos ancestrais. Não é a Cronos (o tempo sequencial, “tempo dos homens”) que devemos reverência, mas a Kairós, (o tempo qualitativo, “tempo divino”) aquele que tem asas nos pés e nos permite “saltar” sem atropelos por entre as vicissitudes e alegrias do cotidiano. Oh, Mitologia abençoada, porque te subestimamos?

Celebrações, tempestades, apagões, viroses, projetos a implantar, matérias a editorar, prazos de compromissos pré-assumidos a se esgotar (e a nos esgotar) levaram-me a impôr ao blog, um silêncio forçado nas últimas semanas. A mente, dispersa entre tantos clamores, não permite que a inspiração se manifeste com plenitude e esta, asas cortadas, somente se detém nas circunstâncias ou se recolhe, a aguardar oportunidade de expressão.

Entregar-se inteiramente a cada trabalho, a cada pessoa, a cada momento, é uma arte a ser exercitada na busca da excelência. E embora haja uma conecção entre tod@s, cada um(a) deve ser cuidad@ de per si, como se únic@ fôra. Somente assim a memória, a observação, a experiência e a inspiração se aliam e se alinham para que cada assunto, cada compromisso, permeado pelo Amor, flua a seu tempo, o tempo de Kairós.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Deusa Mãe

Natureza Mãe-Deusa

não há Poder Maior.

Ignorante, o ser humano

reverencia Maya,

Deusa-Ilusão.


Perdão.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

De Alertas e Sincronicidades

Um de meus temas recorrentes é o fenômeno da sincronicidade ou “coincidência significativa” como explicava Jung, profundo estudioso do assunto. Minhas experiências nesse campo têm sido espontâneas e geralmente ligadas à palavra escrita, talvez pelo fato de, desde que me conheço por gente, eu ser tida e havida como “bicho-de-livro”, já que esse é meu alimento preferido.

Pois bem, no último dia 30, enquanto lia o trabalho de Regina Brito sobre a devastação da Mata Atlântica na região de São Sebastião, fui tomada por uma emoção indecifrável, uma emergência de chorar perdas desconhecidas, o que me levou a postar no mesmo dia a crônica Nas tramas da rede.

Somente ontem, ao ler o comentário que Regina postou no blog, me dei conta de que havia sentido uma espécie de “emoção premonitória” ao ler o seu alerta, haja vista que no dia seguinte fomos tod@s tomad@s por uma consternação real ao acompanhar pela mídia as trágicas consequências da ocupação irracional de encostas em algumas cidades da região sudeste, em especial em Angra dos Reis.

Segundo a autora, o livro – publicado há quase dez anos -, já está a merecer “uma re-escritura”. Possam os deuses inspirá-la e possamos tod@s acatar os clamores da Mãe Natureza a tempo de salvar as próximas gerações. Se cada um(a) pudesse (leia-se “quisesse”) fazer persistentemente a sua parte, denunciando e criticando, mas também mudando pequenos hábitos do cotidiano e conscientizando (especialmente pelo exemplo) as crianças e os adolescentes de que é o seu próprio futuro que está em jogo, talvez pudéssemos reverter novas tragédias que se prenunciam.

Quanto às sincronicidades, que alguns subestimam acreditando tão-somente no raciocínio lógico, “estão aí” a nos mostrar caminhos outros do que aqueles pedregosos e escorregadios que trilhamos repetitiva e alienadamente. Como essas coincidências são a-causais e apenas fazem sentido para aquel@ que as vivencia, talvez fosse interessante procurarmos observar em nosso entorno e em nós mesmos, os sinais e alertas que se oferecem dadivosamente a suavizar nossas “quedas e desvios de percurso”.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Prioridade

Natureza

prioridade

hoje

ou

não-ser

amanhã.

A eira e a beira

Predador da Natureza
o homem destrói. Desconstrói.
Essa a marca do Poder.
Há que demarcá-lo. Delimitá-lo.

Sua fronteira
há de ser o Outro
seja ele quem for
seus direitos e saberes
sua eira, sua beira.