domingo, 11 de novembro de 2012

Domingo, 11 de Julho de 2004, 12:53




De onde vem essa dor?



Da Reportagem







JOSÉ LUIZ ARAÚJO



Não é preciso virar o foco das lentes para as barbaridades no Oriente Médio, para termos um claro exemplo da intolerância. Ela acontece em todos os lugares, em diferentes culturas, em mínimos gestos, mostrando que o ser humano ainda tem muito o que aprender sobre si mesmo.

Para Suzete Carvalho, especializada em Filosofia do Direito (e mestre em Direito do Trabalho pela USP), a intolerância pode ser considerada uma das piores dores da alma, porque revela a insegurança do ser diante da diversidade, daquilo que não conhece ou não compreende.

‘‘O medo do diferente nos faz adotar mecanismos de defesa, como a retaliação e, eventualmente, a retalhação, contribuindo para perpetuar a ausência de paz no mundo’’, afirma a especialista.

Suzete Carvalho explica que retaliação é revide, com ofensa igual ou superior ao dano recebido; é vingança, desforra, represália. Difere de retalhação ou retalhadura, que significa ‘despedaçar’ e também ‘difamar’.

‘‘Como a difamação, muitas vezes, pode ser usada como forma de retaliação, eventualmente há alguma confusão entre os termos’’, afirma ela.

Formação preocupante

Para a especialista em Filosofia do Direito, a educação (formal e não formal, em casa, na escola, na rua...) tem fundamental importância para que o ser humano se torne mais tolerante, uma vez que, analisa, somos educados para sermos competitivos, invejosos e preconceituosos, portanto, para sermos justamente intolerantes.

‘‘Somos incentivados desde cedo a vencer todas as competições e a não levar desaforo para casa. Nossos pais, professores, a Igreja e a sociedade como um todo nos dão exemplos diários de intolerância, embora afirmem o contrário’’, acredita.

Pode parecer que, no dia-a-dia, a mulher seja mais tolerante do que o homem, mas não há essa distinção. Suzete Carvalho explica que ambos são tolerantes em algumas situações e intolerantes em outras. A diferença de gênero restringe-se à questão biológica. No mais, homens e mulheres têm os mesmos defeitos e qualidades, deficiências e potencialidades.

Apesar de toda a carga de influências que recebemos diariamente em todos os nossos momentos (familiar, social e profissional), Suzete Carvalho entende que é possível aprender a ser mais tolerante, uma vez que bondade e tolerância absolutas não existem, são puras abstrações. Para ela, luz e sombra convivem no ser humano.

‘‘Tolerância é a aceitação de nossos limites recíprocos, é respeito por nós mesmos e pelo outro. Não significa tolerar a injustiça social, nem renunciar às próprias convicções’’, analisa.

Aceitar diferenças

Assim, de acordo com a especialista em Filosofia do Direito, tolerância não é condescendência, mas significa respeitar e aceitar a diversidade de nossos modos de expressão, de nosso jeito de ser.

‘‘Aliás, os seres humanos não têm que ser tolerados, mas reconhecidos em seu valor próprio de pessoas merecedoras de respeito e dignidade, pelo simples fato de serem humanos, independente da tradição cultural a que pertençam, de sua origem étnica e racial, da sua cor ou idade e de suas opções, sejam religiosas, sejam sexuais.’’

Para Suzete Carvalho, situações de violência e injustiça não podem ser admitidas, mas falar em ‘tolerância zero’ é abrir espaço à intolerância e à truculência institucionalizadas, daí o fato de a questão ser muito complexa e envolver vários outros questionamentos.

Ela lembra que, de acordo com a Carta das Nações Unidas, praticar a tolerância é viver em paz uns com os outros. ‘‘A meu ver, a melhor forma de aprendermos a tolerância é praticá-la nas pequenas coisas do dia-a-dia, com aqueles que nos são próximos. A concretização da paz requer uma tomada de consciência individual, bem como processos educativos que ensinem a pensar e a dialogar’’, avalia.

Já ao Estado, acredita ela, compete elaborar e aplicar leis justas e imparciais e implementar políticas educacionais, comprometendo-se com sua eficácia. No âmbito individual, informação, autocrítica, ética, capacidade de indignação (contra a injustiça) e compaixão são alguns dos caminhos que levam à construção de uma cultura de paz.



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