sábado, 16 de fevereiro de 2013


COLUNA DA SUZETE

 

                                               CARNAVAL

 

                                                                                                                      Suzete Carvalho*

 

Ao lado das inefáveis belezas naturais com que nosso país foi abençoado e de nossa cultura multifacetada, o Carnaval, sem sombra de dúvida, é uma das principais atrações que alavancam o turismo. Tradicionalmente centrado em Salvador, Olinda e Rio de Janeiro, hoje o reinado de Momo se dissemina Brasil a fora, com seu séquito de seguidores apaixonados, abrindo espaço para a alegria, a arte, a beleza e o sonho.

 

Sim, é bem verdade que muitas pessoas extrapolam e se aproveitam do Carnaval como desculpa para atos desajuizados e até mesmo ilegais, mas também é verdade – e é bom que se lembre aos saudosistas -, que hoje, em que pese o aumento da violência explícita e explicitada minuciosamente pela mídia televisiva, há uma maior conscientização da sociedade como um todo, que dispõe de proteção legal e jurídica, sequer imagináveis nos chamados “bons tempos”, em que também ocorriam fatos e atos escabrosos e violentos.

 

A propósito, lembro de um causo ocorrido comigo há décadas: Muito jovem ainda, numa segunda-feira de Carnaval, estava subindo a Rua Labatut, próxima à Agostinho Gomes, quando senti uma ligeira indisposição e me apoiei na parede de uma casa. Subitamente, sem que tivesse tempo de me aperceber do que estava acontecendo, fui cercada por um bando de meninos que hoje chamaríamos de pré-adolescentes, moradores das proximidades (bom que se saiba que não se tratava de “menores infratores”), todos munidos com frascos do hoje proscrito lança-perfume.

 

Quase sufocando e com os olhos ardendo, disse a eles que estava passando mal, pedi que parassem de esguichar aquele líquido porque estavam me ferindo e tentei gritar por socorro, sem ser atendida, até que consegui dar alguns passos e bater à porta da casa com as forças de que ainda dispunha. Por uma dessas gratas coincidências, na casa havia alguns homens que, rapidamente, “puseram os moleques para correr”, ufanando-se, qual mosqueteiros ou príncipes salvando frágil e incauta mocinha.   

 

“Coisas sem importância”, assim eram vistas as agressões que não levassem a óbito ou não contivessem ataques ao patrimônio. Banalizava-se a violência contra a mulher e se alimentava a agressividade infanto-juvenil masculina, tida como “inocentes brincadeiras”, tão corriqueiras quanto matar passarinho a estilingadas ou amarrar o rabo do gato da vizinha. Anos (não tão) “dourados”, em que se gestava a violência urbana e a Economia de Mercado ou, para usar a expressão de Mino Carta em recente crônica à Revista Carta Capital , a “religião do deus mercado ainda não vingara”.

 

Para encerrar, volto ao tema de fundo, lembrando que o período carnavalesco em geral coincide com o tempo das águas que fecham o verão, como dizia o poeta, e que suor e lágrimas (de alegria e tristeza) são as águas que lavam corpos cansados e inebriados, tomados pela apoteose. Alegria que, por se saber momentânea, fugaz, ilusória, contém em si a tristeza do retorno ao descompasso com que a realidade ainda se apresenta, pois as mazelas do ser humano e da sociedade são as mesmas, apenas se sofisticam e crescem na razão do crescimento populacional.

 

 

*A autora escreve neste espaço toda segunda sexta-feira do mês.  Seus demais escritos, em prosa e verso, podem ser parcialmente acessados e comentados na Página NOVA ELEUSIS que mantém no facebook, bem como no blog www.novaeleusis.blogspot.com

 

**A ilustração é de Danilo Marques, cujos trabalhos podem ser vistos na Pág. ILUSTRADOR DANILO MARQUES, no facebook, bem como no site www.danilomarques.com.br

 

 

 Publ. in “Gazeta do Ipiranga”, 08/02/2013, pág. B-8.

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